Uninter oferta bolsas de estudo à aldeia indígena Pindoty
Autor: Arthur Salles - Assistente de Comunicação AcadêmicaA democratização do conhecimento e a pluralidade de suas manifestações são alguns dos princípios da Uninter. Referência em educação a distância (EAD), o centro universitário proporciona acesso ao ensino superior por meio de 800 polos no Brasil, responsáveis por estenderem caminho a comunidades remotas. É o caso da Ilha da Cotinga, na baía de Paranaguá (PR), onde está instalada a aldeia guarani Pindoty.
Com cerca de 50 habitantes da etnia Mbyá Guarani, a aldeia preserva costumes milenares em sua rotina, mesmo tão próxima da terra dos juruá (como a língua guarani se refere à população branca). Apenas 3km separam a ilha da cidade, uma curta viagem de 20 minutos de barco. Os ensinamentos tradicionais são passados de geração a geração, mas a educação regular ofertada pela escola indígena do território esbarra em um problema: por que não são professores indígenas que ensinam as disciplinas?
O questionamento foi levantado por uma participante do Collaborative Field Experience, projeto de intercâmbio cultural da Uninter com a First Nations University (FNUniv) do Canadá. A dúvida surgiu durante visita do grupo, composto por 15 estudantes canadenses de ascendência indígena e 15 alunos da Uninter à Ilha da Cotinga. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996 prevê aos indígenas o acesso ao conhecimento proveniente de uma educação especializada, com programas e currículos específicos para determinada comunidade, mas esse direito nem sempre é garantido.
Por isso, em uma parceria inédita com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a Escola Estadual Indígena Pindoty, a Uninter concedeu cinco bolsas integrais de licenciatura a cinco membros da comunidade. O objetivo é de formar futuras gerações da aldeia a partir de professores indígenas, que possam compartilhar diferentes experiências ao aliarem conhecimentos técnicos a saberes tradicionais. A aplicação do vestibular ocorreu no colégio da ilha, em 30 de maio de 2023.
A iniciativa tem o propósito de resguardar as memórias históricas e a reafirmação das identidades étnicas dos indígenas, valorizando suas línguas e ciências ao lado de conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional. Desta forma, é importante que o contato multicultural seja conduzido por quem vive e preserva essas tradições: os próprios indígenas.
Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), 3,5 mil escolas de educação básica (1,9% do total) estão localizadas em territórios indígenas e ministram conteúdos específicos e diferenciados, de acordo com aspectos etnoculturais. Já em cursos superiores, o número de indígenas é de 46 mil, com aumento de 374% entre 2011 e 2021, após políticas públicas garantidoras do acesso universitário a essas populações.
Dionísio Rodrigues é cacique da aldeia e professor de guarani. Atuando como intérprete dos alunos falantes de guarani e que aprendem português na escola, ele exerce com grande responsabilidade as duas funções. Foi pensando em poder contribuir ainda mais com a comunidade e com as próximas gerações que ele optou pelo curso de Ciências Biológicas.
“Quero entender o que é a ciência que é estudada hoje pelos não índios e o que a gente pode aprender e trazer […]. A gente vê a ciência de outra forma, então quero juntar esses dois estudos para o benefício da comunidade”, afirma contente após ter sido o primeiro aprovado no vestibular.
“Estou muito feliz de ser aprovado pela Uninter. É um sonho. O objetivo da comunidade é ingressar na faculdade, terminar e voltar para a aldeia. Ter um novo conhecimento, ensinar de uma forma diferente, mas ensinar o que a gente tem de autoconhecimento para nossa comunidade futuramente”, complementa.
As provas foram corrigidas assim que entregues e conduziram os estudantes ao ensino superior. Os outros cursos de licenciatura escolhidos por eles foram Pedagogia, Artes Visuais e Educação Física.
Acompanhamento nos estudos
Mesmo a poucos quilômetros, o deslocamento da ilha até a cidade exige dedicação, gastos, tempo e a colaboração dos céus e dos rios. A escola provê internet e computadores aos estudantes, viabilizando a EAD na comunidade. “[É] muito difícil para eles [indígenas] passarem todo esse tempo na cidade fazendo uma faculdade. É muito mais difícil do que para nós esse distanciamento da aldeia”, comenta a chefe da coordenação técnica local da Funai em Paranaguá, Caroline Willrich. “Foi algo muito maravilhoso mesmo para comunidade. O pessoal ficou superempolgado.”
O programa faz parte do Grupo de Trabalho Diálogos Interculturais: Uninter e Ilha da Cotinga, coordenado pelo professor Guilherme Carvalho. O grupo reúne 12 docentes das escolas superiores de Gestão, Comunicação e Negócios (ESGCN), de Saúde Única (ESSU) e de Educação (ESE). A equipe tem expectativa de uma educação de mão dupla, ofertando conhecimento acadêmico e obtendo ensino tradicional da comunidade.
“Essa experiência que a gente vai ter aqui pode, quem sabe, ser replicada depois em outras comunidades para outros indígenas, em outros ambientes, outros locais. Pode ser uma experiência realmente muito importante para avançarmos num projeto que cumpre uma missão fundamental”, afirma Carvalho, também coordenador do curso de Jornalismo da instituição.
O grupo acompanhará o desempenho dos alunos durante o processo de formação, pensando em possibilidades de adaptação dos conteúdos, materiais e das avaliações quando necessário. As atividades da equipe continuarão até que todos os estudantes se formem, visitando a aldeia em parceria com os colaboradores do polo de Paranaguá. São planejadas visitas para a entrega de materiais, desenvolvimento de atividades práticas e acompanhamento do polo e dos professores sobre o decorrer das formações.
“Esse projeto é um grande divisor de águas para nossa instituição de ensino. […] Em alguns momentos, nós havíamos falado da possibilidade de estarmos em algum aldeamento indígena, em outras regiões, não só no estado do Paraná, e que pudéssemos oferecer o ensino superior, no sentido na formação de professores para que esses indígenas possam ser professores das gerações que virão”, explica o pró-reitor de graduação da Uninter, Rodrigo Berté. “As novas gerações que virão a ter professores que, além de ser apropriarem dos conteúdos [técnicos], possam tratar esses conteúdos na sua língua própria, na língua guarani”, finaliza.
Autor: Arthur Salles - Assistente de Comunicação AcadêmicaCréditos do Fotógrafo: Barbara Carvalho - Jornalista