Um app de quem teve fome de inovar
Autor: Gustavo Henrique Leal - Estagiário de JornalismoA imaginação e a criatividade típicas da infância poderiam nos acompanhar por toda a vida? A trajetória de Jean Pierre Pago da Silva mostra que sim. O traço de engenhosidade, muito presente na infância do egresso Uninter, hoje o faz colher bons frutos na sua trajetória profissional.
Um dos exemplos é o projeto Papoom, que Jean Pierre idealizou e colocou em prática. Trata-se de uma startup de marketplace, que busca ter uma interação com vendedores e moradores da região. A inciativa é promissora. O objetivo é ter dois milhões de pessoas utilizando o app da Papoom já em 2023, revela Jean Pierre em entrevista à RPC, afiliada da Rede Globo no Paraná.
O caminho para alcançar esse sucesso, no entanto, precisou de boas doses de persistência e criatividade. Jean Pierre traz as ferramentas para driblar os percalços do caminho desde a tenra idade. Natural de Curitiba, ele cresceu com seus avós, Arminda Farias e Cícero Félix, em um dos bairros da capital paranaense que sofrem com falta de infraestrutura e com ondas de violência, a Vila Torres.
O olhar voltado para as questões sociais ele herdou dos avós, que foram fundadores de umas das primeiras associações de moradores da vila, em meados da década de 1970. Organizada, a comunidade lutava por auxílio de políticas públicas e melhores condições de vida. Jean Pierre, então na adolescência, estava cercado pelas causas sociais e pelo sonho de um futuro melhor.
Criador de sonhos
“Viu uma necessidade? Atenda-a!” A frase, da animação Robôs, de 2005, é fonte de inspiração para o jovem sonhador da Vila Torres. No filme, um personagem chama especial atenção de Jean Pierre. O Grande Soldador representa o espírito daqueles que acreditam que as coisas podem e devem ser consertadas – ao invés vez de simplesmente descartadas.
Para essa tarefa, uma boa dose de criatividade é necessária. E é neste ponto que o robô da ficção tem impactos na vida real de Jean Pierre. “Meu sonho era ser o Grande Soldador, personagem que inventava muitas coisas. A minha habilidade maior era inventar, criar, ter ideias. E isso foi o meu Norte”, explica.
Um marco na sua trajetória foi aos 24 anos, quando decidiu ingressar na faculdade para cursar Relações Internacionais na Uninter. À época, ele já atuava há alguns anos na área de captação de recursos e de marketing de uma ONG.
“Gostei muito do curso, acho que fez total sentido para mim. Gostava da questão de entender os países, gostava da questão de ter um olhar mais macro sobretudo. Acho que Relações Internacionais trouxe isso”, declara.
Após finalizar o curso, surgiu a oportunidade de participar do projeto Renault Experience 2017, programa que incentiva estudantes de variadas áreas para o empreendedorismo e conta com participantes por todo Brasil. O propósito é fazer com que os estudantes identifiquem um problema e resolvam a solução durante um ano.
A disputa era acirrada. Foram 300 trabalhos inscritos na etapa inicial. Em meio a tantos estudantes cheios de ideias, Jean Pierre, junto aos professores orientadores Elizeu Alves e André Ziegmann e outros colegas, conseguiu destaque.
E o momento da criação da ideia que daria destaque ao grupo é lembrado com detalhes. “Eram seis horas da tarde, lá no Campus Divina, numa escadaria bem escondida. Logo veio a ideia: ‘por que a gente não cria um negócio, como se fosse um sensor de álcool, que capta o nível alcoólico no motorista?’”, recorda Jean.
Assim surgiu a ideia do Sense Car, um dispositivo que, colocado dentro do carro, é capaz de calcular a concentração de álcool na respiração do motorista. Com o projeto preocupado em promover a segurança no trânsito, o time da Uninter conseguiu chegar à final e vencer o Renault Experience 2017. Os três trabalhos melhores colocados apresentaram seus projetos aos diretores da Renault Brasil, ganhando 30 mil reais e a oportunidade de desenvolver uma startup. Conheça mais sobre o projeto no vídeo abaixo.
Fome de transformação
O ritmo de conhecimento e de sucesso vinham pouco a pouco para Jean Pierre. Em 2019, em um domingo faminto, ele teve uma ideia que representou seu maior sonho.
Já quase na hora do almoço, o tão criativo jovem recém-formado morava sozinho e queria sair para comer. Assim decidiu sair pelas ruas da Vila Torres, em busca de um almoço tranquilo.
No entanto, encontrou tudo fechado. Pedir comida por um dos populares aplicativos de entrega não era uma possibilidade, já que a comunidade foi simplesmente tirada do mapa de entrega, devido à situação social e econômica da região.
Ao retornar para casa, teve aquela sensação gostosa de quando o cheiro de comida feita na hora entra e perfuma a casa. Era o almoço de domingo da vizinha, que imediatamente mexeu com seus pensamentos. “E se existisse alguma forma de eu, como consumidor, saber quem é essa minha vizinha que está aqui ao lado cozinhando algo que me interessaria? E se eu pudesse comprar isso? Se ela pudesse vender uma marmita ou um prato? Como eu posso criar alguma coisa assim?”, recorda Jean.
Dessa forma vieram as primeiras ideias de criar um aplicativo que pudesse conectar consumidores e vendedores de comunidades. Seria uma forma de fortalecer o vínculo entre os moradores da vila onde cresceu.
A ideia de um aplicativo ficou na cabeça do egresso e, no final de 2019, decidiu fazer um curso de Design Thinking no Vale do Pinhão, setor da Prefeitura de Curitiba voltado ao desenvolvimento. O curso o ajudou a entender como aquela ideia poderia sair do papel. Então, procurou o instrutor do curso, Guilherme Pinheiro, para ser seu mentor, e Rodolfo Santana, atualmente sócio e CEO da Papoom.
Da inspiração até a concretização do sonho, algumas dificuldades foram encontradas no caminho. A primeira tentativa foi desenvolver um web app (site que se assemelha a um aplicativo). No entanto, os planos foram frustrados pela falta de acessos e pouca visibilidade das comunidades.
Então, no ano seguinte, o grupo resolveu apostar na criação de dois aplicativos: um para consumidores e outro para vendedores. Assim nasceram os apps da Papoom, lançados em agosto de 2020 na Vila Torres.
Durante três meses, a ideia que veio de um momento de fome matou a sede de curiosidade dos moradores. Mais de mil pessoas baixaram o aplicativo e foram cerca de 500 pedidos realizados, porém o sistema não era automatizado. “Era tudo muito manual, muito rústico mesmo. O cara pedia pelo app e eu tinha que ligar para o vendedor dizendo o que ele tinha pedido”, explica Jean.
Com esse formato, a startup consumia muito tempo e principalmente muito dinheiro. Foi o momento de olhar para outras necessidades, buscar investimentos e visibilidade para sua criação atingir outros níveis.
Em junho de 2021, veio o primeiro investimento na Papoom, de uma empresa de São Paulo, a Silver Angels. A ideia do aplicativo para as comunidades chamou a atenção e conquistou o investimento, o que permitiu que, já no início de 2022, a Papoom voltasse aos atendimentos.
Numa mente tão ambiciosa e criativa, aquilo era pouco. Jean seguiu na busca por investimentos e visibilidade para sua criação.
Assim, ele participou da Expo Favela, feira de negócios voltada para empreendedores e favelas, para promoção de negócios. Também participaram do Rocket 2022, reality show de empreendedorismo e inovação feito por uma rede de TV paranaense, que busca premiar as melhores e mais criativas startups. A Papoom foi a vencedora entre as quarenta empresas concorrentes.
O sucesso alcançado ainda não é o topo da trajetória inventiva e voltada para a ação social de Jean Pierre. Só na Vila Torres, o app tem mais de 1.500 downloads, com mais 1.500 pedidos realizados e 130 vendedores cadastrados.
O idealizador vê a Papoom em crescimento, mas tem certeza que ainda não alcançou seu total sucesso. O objetivo é conseguir mais investimentos e expandir para fora, alcançando comunidades como Paraisópolis, em São Paulo, Rocinha e Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, Nordeste da Amaralina da Bahia e diversas outras. E ele projeta o que a startup pode significar daqui uma década. “Eu vejo que as comunidades vão ser uma das áreas que mais vão sofrer com diversas coisas. Daqui a 10 anos, as comunidades vão precisar ter uma autossustentabilidade em todas as coisas. Se elas tiverem ferramentas para se conectar com qualidade, isso vai minimizar essas dores que elas vão sofrer. Então, sempre tive essa visão do futuro”, visualiza Jean.
Autor: Gustavo Henrique Leal - Estagiário de JornalismoEdição: Larissa Drabeski e Arthur Salles
Créditos do Fotógrafo: Acervo pessoal