Teoria do Elo: violência interpessoal e os maus-tratos aos animais

Autor: Poliana Vicente de Souza (*)

A violência é um problema de saúde pública mundial, que afeta pessoas de diferentes culturas e classes socioeconômicas. Em sua definição, violência é entendida como o uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa, ou mesmo contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação. A violência pode ser classificada conforme as características de quem comete o ato: violência autoinfligida, interpessoal e coletiva. Ou ainda, de acordo com a natureza dos atos violentos: física, psicológica, sexual e negligência/abandono.

Segundo estudos, a maioria dos casos de violência contra grupos vulneráveis, como mulheres, crianças e idosos, encontra-se no interior dos lares, ou seja, nas famílias. E a partir disso, devemos considerar os atuais conceitos de família, que têm se modernizado cada vez mais, como nas famílias multiespécies. A existência de famílias multiespécies, compostas por pessoas que reconhecem e legitimam seus animais como membros da família, permite o convívio entre humanos e animais de diversas categorias, compartilhando o mesmo ambiente.

Essa interação humano-animal-ambiente implica relações positivas que promovem saúde e bem-estar, porém, no ambiente familiar, podem surgir interações negativas, como nos casos de maus-tratos aos animais e violência doméstica, demonstrando ainda uma possível correlação entre esses dois tipos de violência.

Sabe-se que os maus-tratos aos animais é um problema de saúde pública, assim como os casos de violência humana. Com isso, pode-se definir maus-tratos aos animais, segundo resolução do Conselho Federal de Medicina Veterinária, como qualquer ato, direto ou indireto, comissivo ou omissivo, que intencionalmente ou por negligência, imperícia ou imprudência provoque dor ou sofrimento desnecessários aos animais.

Nesse contexto, a ocorrência de violência na família é reconhecida como um fator de risco para maus-tratos a outros indivíduos que compartilham esse ambiente. A partir disso, diversas pesquisas demonstram a existência de uma correlação entre a ocorrência de maus-tratos aos animais e a violência interpessoal, sendo internacionalmente denominado pelo termo Elo (tradução da palavra Link do inglês).

Estudos apontam taxas de concorrência de violência por parceiro íntimo contra mulheres e maus-tratos a animais entre 25% e 86%. No estado de Pernambuco, foi demonstrada uma prevalência de 51% de maus-tratos aos animais de mulheres vítimas de violência doméstica. Além disso, dentro do contexto do Elo no ambiente familiar, também são demonstradas associações de maus-tratos aos animais e abuso infantil ou negligência de idosos.

Diante do exposto, a Teoria do Elo aponta a possibilidade de que em um mesmo ambiente familiar pode haver algum tipo de violência interpessoal ao mesmo passo que ocorrem maus-tratos aos animais pertencentes a essa família. Nesse sentido, é importante compreender a violência como um fator de vulnerabilidade social, e que animais pertencentes a tutores em vulnerabilidade social, também estão sujeitos às mesmas vulnerabilidades.

Com a correlação existente entre maus-tratos aos animais e violência interpessoal, surge ainda a necessidade de se realizar uma abordagem integral da violência nas estratégias de prevenção/intervenção, que não esteja voltada apenas para a atenção individual da vítima, pois deve-se considerar todos os fatores e indivíduos envolvidos, com uma visão multiprofissional e intersetorial. Essa abordagem integral, a partir do conhecimento da Teoria do Elo, deve ser verificada tanto pelos serviços que realizam a prevenção/intervenção de violência humana quanto pelos profissionais e serviços que atuam no combate aos maus-tratos de animais, com a visão ampliada da abordagem de Saúde Única.

*Poliana Vicente de Souza é médica veterinária, especialista em Saúde da Família. Professora-tutora do curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Internacional Uninter.

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Autor: Poliana Vicente de Souza (*)
Créditos do Fotógrafo: Pixabay


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