Startups promovem disrupção e inovação na legislação societária brasileira
Autor: Neide Borscheid Mayer e Armando Kolbe Junior*Entre outras denominações existentes para Startups, temos a Lei Complementar n° 123, de 14 de dezembro de 2006, conhecida como “Lei do Simples Nacional“, que em seu texto afirma que Startup é: “a empresa de caráter inovador que visa a aperfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de produção, de serviços ou de produtos, os quais, quando já existentes, caracterizam Startups de natureza incremental, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente novo, caracterizam Startups de natureza disruptiva”.
Alguns dados recentes, disponibilizados pela Associação Brasileira de Startups (Abstartups), no ano 2020, apontam que o Brasil dispõe de 12.700 startups, sendo esse número 20 vezes superior ao ano de 2011, quando foram contabilizadas 600. As startups estão distribuídas por regiões, sudeste com 5730, sul com 2231, nordeste tem 994, centro-oeste tem 580 e norte, 228. Formam ainda esse ecossistema: 363 incubadoras e 57 aceleradoras.
Atualmente temos no Brasil 12 Unicórnios – startups com valor de mercado maior do que US$ 1 bilhão –, são elas: 99, Nubank, Arco Educação, Stone, Movile (iFood), Gympass, Loggi, Quinto Andar, Ebanx, Wildlife, Loft e recentemente a Vitex.
O Projeto de Lei Complementar 249/20 institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, e em seu texto define como startup empresa de inovação, com até seis anos de existência e R$ 16 milhões de faturamento bruto anual, no ano-calendário anterior ou de R$ 1,3 milhão multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a um ano, com até seis anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e que atendam a um dos seguintes requisitos, no mínimo: declaração, em seu ato constitutivo ou alterador, de utilização de modelos de negócios inovadores; ou enquadramento no regime especial Inova Simples.
De acordo com os ministros da Economia, Paulo Guedes; e da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, tanto o setor público quanto o setor privado poderão se beneficiar, direta ou indiretamente, dos resultados do projeto, caso aprovado pelos parlamentares.
Alguns pontos a serem destacados vão de encontro aos “investidores anjos”, pois de acordo com o texto, as startups poderão admitir aporte de capital, por pessoa física ou jurídica, que não integrará o capital social da empresa, incentivando assim as atividades de inovação e os investimentos. Esses investidores não se tornarão sócios da empresa nem possuirão direito à gerência ou a voto em sua gestão, entretanto, poderão participar nas deliberações em caráter estritamente consultivo, conforme contrato, e não responderão por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial. As empresas que também possuem obrigações legais de investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação estarão autorizadas a cumprir seus compromissos com aporte de recursos em startups.
Esse projeto traz um aspecto inovador nas possíveis fontes de financiamento desse tipo de empresas, desburocratizando as relações de investidor x empresa e, por outro lado, abrindo um caminho para estreitar as relações de pesquisa e ciências com organizações privadas.
Além disso, encontramos, também, na proposta, autorização para que os órgãos e as entidades da administração pública possam instituir os chamados programas de ambiente regulatório experimental, com um conjunto de condições especiais simplificadas e temporárias para que as empresas participantes desenvolvam modelos de negócios inovadores e testem técnicas e tecnologias experimentais.
Poderão ser contratadas pessoas físicas ou jurídicas pela administração pública, de forma isolada ou em consórcio, para a realização de testes de soluções inovadoras por elas desenvolvidas ou a ser desenvolvida, com ou sem risco tecnológico, por meio de licitação na modalidade especial.
Em suas disposições finais, o PL simplifica as sociedades anônimas, não somente para startups, mas para todas as Sociedades Anônimas que tenham faturamento inferior a R$ 78 milhões anuais e passarão a realizar a publicação de convocações de assembleias, divulgações das demonstrações contábeis e outros documentos de forma eletrônica, e não mais em periódicos de grande circulação, levando a uma redução dos custos intrínsecos relacionados à geração e divulgação das informações.
Apesar do texto ser um primeiro passo para a desburocratização do setor, alguns empresários e especialistas criticam a ausência de alguns temas que foram debatidos nos últimos meses.
Algumas questões tributárias não foram devidamente tratadas, como por exemplo, a possibilidade de SAs fazerem uso do regime tributário do Simples ou a possibilidade de investidores-anjos compensarem perdas sobre ganho de capital.
Determinadas questões trabalhistas também ficaram de fora, como a possibilidade de remuneração pela participação de ações, as chamadas “stock options”. Alguns empresários consideram esse como um recurso importante para pequenas empresas conseguirem atrair talentos de alto nível, à semelhança do que já é uma prática comum em empresas de grande porte. Outra ausência mencionada é a do “startup visas”, uma espécie de facilitação de visto de permanência no Brasil para atrair cérebros estrangeiros ou pessoas que queiram começar seus negócios no país.
Novos horizontes são vislumbrados com os avanços da legislação brasileira nesse ecossistema, proporcionando regulamentação jurídica aos emergentes modelos de negócios.
São inúmeros os desafios que as startups podem vir a enfrentar, principalmente quando estão no começo e os gestores não podem deixar de observar as normas jurídicas e contábeis específicas para os negócios que operam. Por terem características peculiares, é vital que cada empreendedor tenha uma assessoria contábil, com vistas a encontrar na lei as respostas para o seu problema.
* Neide Borscheid Mayer é coordenadora do bacharelado em Ciências Contábeis da Uninter. Armando Kolbe Junior é mestre em tecnologias e coordenador do curso de Gestão de Startups e Empreendedorismo Digital na Uninter.
Autor: Neide Borscheid Mayer e Armando Kolbe Junior*Créditos do Fotógrafo: James Oladujoye/Pixabay