Sobre como o preconceito surge de histórias mal contadas
Ao se deparar com um determinado fato é preciso ouvir os dois lados da história. A escritora Nigeriana Chimamanda Adichie fala disso em uma de suas palestras. Ela fala dos perigos de uma história única, ou seja, os riscos de mostrar elementos culturais de uma hegemonia, o que é prejudicial tanto para quem é retratado quanto para quem consome a informação.
Em uma de suas palestras, a aluna de Pedagogia Luciana Rosa faz um questionamento sobre o que vem na cabeça das pessoas quando se menciona a palavra África. Para alguns, a primeira coisa que surge são as palavras fome e miséria. ‘’Isso acontece porque estas são as coisas que as mídias trazem. A África é um território muito grande. A Nigéria, por exemplo, é um país muito parecido com o Brasil’’, explica Luciana.
Ainda segundo ela, a história dificilmente aborda com profundidade os registros do negro no Brasil. Os livros são focados nos portugueses e não sobre as origens, culturas e a história do negro quando estava na África. “Contam que o negro foi o que melhor se adaptou à escravidão. Isso é uma mentira. Ninguém se adapta à escravidão, o que aconteceu é que o povo deles sabia as técnicas e os conhecimentos de cultivar e de mineração que o índio não tinha. Então, são muitas histórias (mal) contadas por quem detém o poder”, diz.
A falta de retratar a história africana e os heróis do movimento negro, como João Cândido, que foi um líder durante a Revolta da Chibata, resultam em um desconhecimento do público sobre suas contribuições históricas. “Não foram mostrados para nós porque [para os grupos dominantes] não é interessante contar essas histórias. É mais interessante contar que essas pessoas se mantiveram de cabeça baixa, o que não é verdade. Eles lutaram e trouxeram contribuições. Então, é mostrado uma história para que o preconceito continue”, relata Luciana.
Os preconceitos surgem no meio destas circunstâncias. Porém, hoje o crime de racismo é amplamente combatido, um crime inafiançável e imprescritível. Esses assuntos foram debatidos durante uma palestra na Uninter do polo Lucas do Rio Verde (MT), no final de novembro. O evento foi organizado para comemorar o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro. Além dos debates sobre a cultura negra, foi realizado um desfile de bonecas com direito a premiação.
Aluna de Pedagogia na modalidade a distância, Luciana conta de forma irreverente que armou para os participantes, pois a princípio mostraria apenas sobre a boneca Abayomi, que faz parte da cultura africana, mas depois explicou aos demais que abordaria muito mais coisas, como a cultura negra e o preconceito. “Tive a ideia de trazer a boneca como atrativo, mas gosto de brincar e dizer que na palestra foi montado uma arapuca, pois trouxe muito mais coisas. Todos tiveram uma visão de surpresa, pois pensavam que seria mais uma daquelas palestras ‘chatas’, mas depois todos acabaram se surpreendendo positivamente”, diz.
A boneca usada como atrativo é a Abayomi, que significa “presente precioso” em Ioruba (uma etnia do continente africano). Eram presentes de mães para filhas como forma de consolação durante as longas viagens de navio a que os povos que foram escravizados eram submetidos. As bonecas eram feitas de pedaços de suas saias ou retalhos e não possuíam rosto, pois significaria todas as etnias que conviviam juntas.
Segundo Luciana, a grande questão que deve ser repassada para as pessoas é a de que investiguem tudo e não siga uma história única, pois o preconceito nasce de fatos que não foram apresentados de forma clara, contextualizada e verdadeira.
Autor: Talita Santos – Estagiária de JornalismoEdição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Arquivo PAP Lucas do Rio Verde