Quando as mulheres poderão andar sem medo nas ruas?

Autor: Poliana Almeida - Estagiária de Jornalismo

Você já parou para pensar que todas as mulheres à sua volta já foram vítimas de assédio? Elas podem até não saber, mas aquele comentário ofensivo disfarçado de elogio também atenta contra a condição feminina. E viver com constante medo de passar por uma situação dessas de novo faz com que as mulheres mudem sua rotina. Mudar o itinerário ou contar com uma presença masculina para realizar alguns trajetos são ações corriqueiras para as mulheres.

O espaço urbano, principalmente à noite, é um ambiente hostil às mulheres. A falta de segurança e a má iluminação acabam sendo fatores relevantes para elas ao decidir sair de casa. Pensando em um urbanismo que leva em conta a perspectiva feminina, a coordenadora dos cursos de Pós-graduação em Arquitetura e Design da Uninter, Giselle Dziura, promoveu um bate-papo sobre o tema “Cidade para mulheres, política para mulheres”, na última edição do programa Segredos da Arquitetura.

De mulher para mulher

Para debater o tema, Giselle convidou a arquiteta e urbanista Laís Leão. E a escolha não foi por acaso. Laís é especialista em administração pública e mestranda em gestão urbana. Além disso, também é ativista pela igualdade de gênero e dirige uma organização social chamada InCities – rede criada por ela em 2019 visando à promoção de cidades mais inclusivas, que têm como objetivo a segurança urbana para mulheres.

Laís se define como uma pessoa muito questionadora. “Para mim, quando alguém dizia: ‘você tem que aceitar as coisas porque elas são assim’, nunca me desceu muito bem. E daí veio essa paixão tanto pelo urbanismo quanto pela política”, lembra.

Este é um ponto importante levantado pela entrevistada. Segundo ela, a arquitetura e o urbanismo andam juntos com a política. Sendo assim, é impossível dissociar um do outro. “A arquitetura e o urbanismo sempre foram estudos muito políticos”, destaca.

Giselle concorda com o ponto de vista de Laís. Ela acrescenta ainda que “a arquitetura está totalmente associada à sociedade. Quando nós construímos um espaço, ele é para a sociedade, seja para o indivíduo, seja para um coletivo”.

Mas, e se o arquiteto(a) decide trabalhar com alto padrão, não é social? A arquiteta deixa uma reflexão sobre isso. “Na arquitetura de alto padrão, você está escolhendo segregar certos custos, métodos e espaços para um grupo. Tudo bem, mas você precisa ter consciência desse processo”, alerta a mestranda.

Para além disso, a arquiteta e urbanista deixa uma sugestão para os cursos superiores. Laís indica que o pensamento crítico sobre o espaço urbano deve estar sempre presente na sala de aula, em todos os âmbitos. “Não é porque eu trabalho com interiores que não estou influenciando o social. Tudo é social”, afirma.

Ela acrescenta ainda que é preciso sempre ter em mente que uma construção é feita coletivamente para um coletivo, logo o urbanismo se torna político também.

Arquitetura política

Giselle questionou a convidada sobre possíveis percalços sofridos neste meio, e Laís relembrou de algumas situações. Ela conta que em seu dia a dia conversa com muitos políticos. O assunto é a construção de uma cidade mais segura para as mulheres. E revela que as dificuldades começam na não-presença das mulheres nesse espaço de decisão. “Quando eu preciso articular um projeto de lei, é muito mais fácil com uma vereadora do que um vereador. Porque eu não preciso explicar para ela que as mulheres sentem medo, ela sabe”, diz a CEO do InCities.

Buscando na memória, a profissional se recorda que é muito comum, quando está com um colega homem, sentir o peso de que as pessoas dão mais valor ao que ele está falando. “Às vezes, sinto que demora para minha voz ser ouvida”, complementa.

Esse debate nos convida a questionar: mas a cidade é insegura para todo mundo, por que só as mulheres são o foco da aplicação desse trabalho? A convidada concorda que as cidades brasileiras são perigosas para todos, mas a “insegurança e o medo constante de acessar os espaços é mais marcante para as mulheres”. Este recorte foi feito partindo do pressuposto de que “se uma mulher se sentir bem lá, é óbvio que o homem se sentirá bem também”, declara Laís.

Não é porque estamos no mês da mulher que temas como esse são trazidos à tona. “Enquanto mulher, a gente precisa de muito mais esforço para conseguir algo, chegar a algum lugar, por conta do gênero”, destaca Giselle. E isso acontece em todos os dias do ano.

Laís reforça este pensamento: “Nós temos um caminho muito longo a seguir. E acabamos tendo que colocar o dobro de energia do que um homem colocaria para fazer exatamente a mesma coisa. Isso porque a sociedade nos cobra em dobro”, conclui.

O programa Segredos da Arquitetura foi ao ar no dia 08.mar.2021, pela Rádio Uninter. Você pode ter acesso ao conteúdo completo clicando aqui.

Incorporar HTML não disponível.
Autor: Poliana Almeida - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Rene Asmussen/Pexels


Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *