Por que continuamos matando mulheres? Uma sociedade justa e plural precisa de inclusão e equidade
Autor: Evandro Tosin – Assistente multimídiaUma agressão física a cada dois minutos. Foram 266.310 casos de lesão corporal dolosa, fruto de violência doméstica, registrados no Brasil em 2019. São quase 1 mil pedidos de medidas protetivas por dia no país. Esses são dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Números que mostram um aumento nos casos de violência de 5,2% em comparação ao ano de 2018.
Entre os casos de feminicídio, foram 1.326 vítimas em 2019, um crescimento de 7,2%. O relatório também apresenta índices de violência contra a população LGBTQI+ (sigla para lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros, queer e intersexuais), categoria na qual há grande subnotificação – apenas 11 estados do país registram estes casos.
O seminário interativo Diversidade, Empoderamento e Desigualdades, transmitido no último dia 27.abr.2021 na página da Escola Superior de Gestão, Comunicação e Negócios da Uninter, discutiu esse cenário. Com mediação das professoras Grazielle Ueno Maccoppi e Flavia Roberta Fernandes, o evento recebeu como palestrantes: Rafael Otta, Cintya Alessandra Santos, Tais Prass Cardoso e Karen Sturzenegger.
Rafael Otta, advogado, empresário e consultor, explica alguns dos conceitos chave para entendermos a questão: diversidade representa as infinitas possibilidades de existir e assumir identidades diferentes; inclusão é ação, fazer o outro sentir que importa; equidade é a ferramenta para atingir um mesmo ponto; e pertencimento, quando a individualidade é respeitada. Cada vez mais empresas brasileiras prestam atenção a estes termos.
“Antigamente, a diversidade era relacionada à gestão de pessoas, de cinco anos para cá, passou a ser também relacionada com a sustentabilidade. Então, por que você precisa ter times diversos? Resposta: precisa ter times diversos para gerar produtos e serviços que sejam adequados à sociedade, que é plural. Como um time de pessoas iguais vai pensar em algo diferente e inovar? As empresas que não estiverem adequadas vão perder clientes, fornecedores e parceiros comerciais. As grandes empresas já estão avaliando critérios de diversidade antes de contratar seus fornecedores”, explica.
O ano de 2020 foi marcado pela pandemia, que entre outros aspectos registrou o aumento da violência doméstica e agravou a situação de desigualdade, mostrando que para muitas pessoas o lar não é um lugar seguro. Um dos impactos deste cenário é que a sensibilidade a questões socioambientais aumentou e começa a ganhar destaque nas ações de empresas ao redor do mundo.
O termo “ESG”, sigla em inglês para Environmental, Social and Governance (ambiental, social e governança), vem ganhando destaque no âmbito das discussões que envolvem tanto ações políticas como da sociedade civil. A sigla representa compromissos e medidas no sentido de reduzir os impactos ambientais de um negócio, bem como esforços para a promoção de um mundo mais igualitário e responsável para todos os envolvidos na empresa.
O Brasil é o quinto país no mundo no ranking dos que mais matam mulheres por razões de gênero. Por que essa violência existe, e quais são suas causas? Como fazemos para enfrentar essa violência? Taís Prass Cardoso é advogada, mestre em doutoranda em diversidade cultural e inclusão social – pesquisadora das temáticas de inclusão, gênero, violência e diversidade.
Taís responde: “A base da violência é a desigualdade de gênero. A sociedade brasileira está ancorada em uma cultura que a gente chama de patriarcal e machista. Que coloca homens e mulheres em papéis sociais desiguais, enquanto o homem ocupa os lugares de prestígio social e poder. Poder, inclusive, sobre o corpo feminino. A gente chama isso de objetificação. A própria legislação brasileira fazia esse reforço social, confirmava esses preceitos. Porque a mulher era vista como propriedade do homem, com pouquíssimos direitos”, diz.
A advogada pontua que a legislação avançou neste sentido. “Hoje nós temos leis que vêm fazer esse enfrentamento. Em 1988, a legislação colocou homens e mulheres em igualdade pela primeira vez. Depois disso, a lei Maria da Penha, em 2006, foi um marco legislativo em defesa da mulher. Depois, a lei do feminicídio, em 2015, e a lei da importunação sexual em 2018. Agora, a lei de stalking (ou perseguição) em 2021. Mas vale falar que a violência doméstica é um ciclo, difícil de se identificar”, explica Taís.
O empoderamento da mulher que sofre a violência doméstica é fundamental, e para isso é necessário contar com redes de apoio públicas e privadas, ONGs, famílias, amigos e pessoas de confiança para conversar sobre o assunto. De acordo com dados do Fórum de Segurança Pública, 52% das mulheres que sofrem violência doméstica não chegam a denunciar.
“Nós precisamos combater, denunciar. Existe o ‘ligue 180’ (gratuito e 24 horas), qualquer pessoa que tiver testemunhado deve fazer essa denúncia. Se a gente estiver presenciando uma violência eminente, que está acontecendo, o número 190 é o mais indicado. Precisamos agir com uma cidadania ativa, porque só assim vamos chegar ao mais importante, uma mudança do pensamento e dessa cultura, que está na raiz da sociedade”, alerta Taís.
Cintya Alessandra dos Santos, docente da Uninter com 15 anos de atuação em desenvolvimento humano, lembra da importância histórica dos movimentos feministas. A professora resgata a frase da filósofa francesa Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher, torna-se mulher”. O movimento feminista foi fundamental para a conquista de avanços na luta por direitos igualitários.
“Precisamos construir uma sociedade mais justa, com maior equidade, promover a diversidade que existe em nossa sociedade plural. Sabemos que é muito mais efetiva qualquer empresa que respeite a sua pluralidade, dentro do seu corpo de funcionários. Precisamos trazer e promover a representatividade feminina, praticar a humanidade, desenvolver empatia e se sensibilizar ao que outro está vivendo”, afirma Cintya.
Karen Sturzenegger, tutora dos curso de Gestão de Turismo da Uninter, lembrou de mulheres que marcaram época: Olympe de Gouges (1748-1793), dramaturga, ativista política e abolicionista francesa que escreveu um livro que defendia o direito das mulheres numa época em que o assunto ainda não era debatido; Mary Wollstonegraf (1759-1797), escritora e filósofa inglesa, uma das pioneiras no debate sobre o feminismo; e a brasileira Nísia Floresta (1810-1885), considerada a primeira feminista no país, autora da obra “Direitos das mulheres e injustiça dos homens”, que atuou em defesa das mulheres, índios e escravos, em sua época.
A íntegra do evento continua disponível na internet. Você pode assistir clicando aqui.
Autor: Evandro Tosin – Assistente multimídiaEdição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro