Por que ainda é preciso dizer que “as vidas negras importam”
Autor: Igor Ceccatto - Estagiário de JornalismoO movimento Black Lives Matter (“Vidas Negras Importam”, em tradução livre) foi fundado em 2013 em resposta à absolvição de George Zimmerman, segurança de um hotel que atirou e matou o adolescente afro-americano Trayvon Martin, de 17 anos, na Flórida (EUA), em 2012. As fundadoras Patrisse Cullors, Alicia Garza e Opal Tometi lançaram no Twitter a hashtag #BlackLivesMatter, na época do julgamento de Zimmerman, e não demorou muito para que o movimento tomasse as ruas dos Estados Unidos.
Basicamente, o movimento busca combater o racismo recorrente na sociedade norte-americana e a violência por parte de agentes da lei, como policiais e seguranças, contra negros e afro-descendentes. Ao afirmar que vidas negras importam, o balcklivesmatter questiona a estrutura social e econômica que faz com que algumas vidas tenham mais valor do que outras nos EUA.
Nas últimas semanas, um novo acontecimento de violência policial contra um homem negro, que resultou na morte de George Floyd, reacendeu o movimento e levou milhares de pessoas às ruas. Os protestos perduram desde o dia 25 de maio, ultrapassando as fronteiras norte-americanas e estimulando atos contra o racismo e em memória de Floyd (e de outros negros que perderam a vida de forma semelhante) em países como Brasil, França, Alemanha, Nova Zelândia, Canadá e Reino Unido.
O movimento foi pauta da live “#blacklivesmatter e a longa história do movimento negro norte-americano”, realizada no dia 01.06.2020 na página do curso de Relações Internacionais (RI), como parte das atividades do Observatório de Conjuntura (projeto de extensão da Uninter, realizado pelos cursos de Relações Internacionais e Ciência Política). A transmissão foi conduzida pela professora da Uninter Natali Laise Zamboni, que recebeu e a psicóloga Alice Carvalho, estudiosa do movimento negro no Brasil.
Em entrevista à Central de Notícias Uninter após o evento, Natali explicou os principais pontos da temática.
CNU – Como o movimento negro norte-americano surgiu?
Natali Laise Zamboni – O movimento negro-norte americano tem uma longa história que data da Guerra de Secessão. Os Estados Unidos, assim como o Brasil, constituíram-se em um Estado escravocrata, de modo que a luta negra se deu desde o princípio pelo direito à liberdade. Mesmo após o fim da escravidão no país, a sociedade norte-americana, principalmente em estados do Sul, ainda manteve aspectos da sua legislação e organização social que promoviam a segregação racial. Isso era possível por causa da doutrina “Separados, mas iguais” que justificava e permitia a segregação racial nos Estados Unidos como não sendo uma violação da décima-quarta emenda. Assim, era permitido que setores públicos ou privados pudessem ser separados por critérios de raça, desde que a qualidade de cada um destes serviços fosse igual.
CNU – Quando foi que isso começou a mudar?
Natali – A doutrina “separados, mas iguais” acaba por perder o seu valor jurídico a partir da decisão da Suprema Corte no caso Brown versus Board of Education, em 1954. Assim, os anos de 1950 e 1960 foram marcados pela ascensão de movimentos que demandavam o fim da discriminação racial no país. É nesse momento também que ganha força nos Estados Unidos o Movimento dos Direitos Civis dos Negros, que tinha Martin Luther King como o seu principal líder. Esse movimento envolveu a realização de manifestações por igualdade racial por todo o país. Dentre as lideranças, destacam-se a defesa da desobediência civil e da não-violência por parte de Martin Luther King, e a defesa de que os negros deveriam recorrer a todos os meios possíveis, incluindo a violência, para alcançar diretos iguais, preconizada por Malcolm X. O movimento dos anos 1950 e 1960 terminou por eliminar os mecanismos formais, como a segregação, de racismo na sociedade norte-americana. No entanto, a partir disso novas problemáticas passaram a ser pauta do movimento, como desigualdade social, violência social, racismo e diferenças de oportunidades com relação a pessoas brancas.
CNU – Qual a importância dessa temática para o Observatório de Conjuntura da Uninter?
Natali – Esse tema é importante para o Observatório de Conjuntura Internacional porque o racismo estrutural é um problema que se localiza na intersecção entre o doméstico e o internacional, na medida em que evidencia dinâmicas e aspectos característicos das sociedades nas quais se pronuncia, mas também tem sua origem na formação histórica das relações internacionais e do próprio capitalismo. Afinal, os processos de colonização e escravização (em larga escala e com fins comerciais) dos povos não-brancos constituem-se em uma das bases fundacionais de uma sociedade internacional centrada no Estado e no poder. A lógica da guerra entre nações e da mercantilização de vidas humanas a partir de sua cor pautou por muito tempo o ordenamento político internacional e interno dos Estados. Esse processo teve como resultado a formação de sociedades fraturadas e marcadas pela desigualdade, com base em classe, gênero e raça. Sem falar das diferenças entre norte e sul global causadas e aprofundadas pelo desenho colonial dos éculos passados e pelo modelo de inserção no capitalismo internacional legado aos países do sul global. Portanto, os protestos contra o racismo na atualidade estão vinculados a uma história de opressão e segregação que perdurou por séculos.
Autor: Igor Ceccatto - Estagiário de JornalismoEdição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Rhododendrites/Wikimedia Commons
Eu fico muito indignada com essa brutalidade, nós brasileiros não somos totalmente brancos, somos mestiços de raças. Gostaria de fazer um abaixo assinado contra o racismo. Esse povo que faz racismo, precisava de um corretivo.