Pão que o viado amassou é sinônimo de inclusão e empregabilidade
Autor: Pedro Henrique Milano Calandreli - estagiário de jornalismoVocê já deve ter ouvido a expressão “o pão que o diabo amassou”. Na cultura popular, a expressão é sinônimo de sofrimento. Mas, e o pão que o “viado” amassou? Representaria o quê?
Para Gabriel Castro, é significado de sabor, alegria e inclusão. Ator, professor de teatro e DJ, em 2020, ele se tornou também empreendedor, dando início à padaria O Pão que o Viado Amassou, no bairro Rebouças, em Curitiba. A produção é marcada por produtos coloridos e com muito glitter, além de nomes divertidos e criativos com referências ao mundo pop.
No entanto, um dos diferenciais do estabelecimento é que todos os funcionários integram a comunidade LGBTQIAPN+, grupo social que historicamente tem menos oportunidades mercado de trabalho.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população LGBT+ é composta atualmente por cerca de 20 milhões de brasileiros. Mesmo representando um número expressivo, esta é uma comunidade que encontra grande dificuldade de ingressar e se manter no mercado de trabalho, de conquistar lugares em espaços de liderança e poder e que constantemente se encontram em situações de vulnerabilidade social.
De acordo com um recente levantamento realizado pela Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região (AMATRA1), que entrevistou 289 empresas e cerca 1,5 milhão de funcionários, apenas 4,5% das vagas de emprego são ocupadas por pessoas LGBTQIAPN+. Números são ainda mais baixos quando levamos pessoas trans em consideração, que representam apenas 0,38%.
“Depois de pensar um pouco a respeito, se tornou natural para mim a ideia de que eu não posso vender uma imagem, me apoiar em cima de um arco-íris, monetizar isso pra mim e não ter alguma forma de na prática chegar em alguém da comunidade. Era honesto, pelo menos, ter pessoas LGBT trabalhando comigo”, explica Gabriel.
No entanto, a iniciativa esbarrou em outra barreira: a dificuldade de acesso dessas pessoas à formação e qualificação profissional. “Quando veio a necessidade de abrir a loja, eu percebi o quanto a gente não é preparado. Eu falava pra minha irmã ‘Não tem como a gente não ter pessoas LGBT trabalhando de ponta-a-ponta, seja funcionários ou fornecedores’. Quando construímos a loja, nós procuramos um pedreiro que fosse LGBT, uma arquiteta que fosse LGBT e foi nesse momento que percebi essa barreira, pois muitos de nós não temos acesso a formação”, reflete Gabriel.
Foi então que ele decidiu apostar na formação da sua equipe com foco na inclusão. “Se eu quisesse fazer uma mudança por dentro, eu teria que abrir mão de certas coisas: Oi LGBT, você quer trabalhar na cozinha e não tem formação? A gente te forma aqui dentro”, recorda.
O negócio gerou grande repercussão na capital paranaense no período de pandemia por meio das redes sociais, e especialmente após a loja física ser inaugurada em setembro de 2021. A padaria conta com mais de 71 mil seguidores, embora atualmente esteja em processo de transição, com a sede temporariamente fechada.
Mesmo em meio a pausa, o estabelecimento segue sendo reconhecido. Em maio deste ano, Gabriel recebeu o prêmio de profissional do ano na câmara dos vereadores de Curitiba por meio de um processo de votação popular. “Foi uma delícia [receber o prêmio]. Foi um sentimento de reconhecimento e de satisfação tanto pessoal quanto profissional, mas principalmente porque das pessoas que votaram nem todas eram LGBT. Na primeira fase era a indicação, aí na segunda fase foi a votação de fato. Isso mostra como realmente conseguimos furar a bolha e chegar em outros lugares”, destaca.
A trajetória de Gabriel e do seu negócio foi o tema de estreia, no dia 6 de setembro, do programa Pajubá, na TV Uninter, que tem a proposta de abordar temáticas relevantes e promover um espaço de inclusão para a comunidade LGBTQIAPN+. O programa é quinzenal, com apresentação de Igor Horbach, Nayara Rosolen e Rafael Lemos recebem convidados para uma sessão de bate-papo.
Pajubá ou Bajubá, significa voz, fala, som da voz. Esta é uma expressão utilizada por integrantes da comunidade LGBT+ que não se trata apenas de uma simples gíria, mas principalmente como um sinal de resistência e de construção de identidade, apropriada e ressignificada por este grupo social.
O programa está disponível neste link clique aqui
Autor: Pedro Henrique Milano Calandreli - estagiário de jornalismoEdição: Larissa Drabeski