O sonho de emancipar o trabalhador
“Quem viver provará nossa emancipação”, diz Fernando Anitelli, na canção “Quando a fé ruge”, da banda Teatro Mágico. A emancipação foi tema da pesquisa desenvolvida pela mestranda Marilis de Castro Muller, “O Espaço da Palavra: O Trabalho Ressignificado”, em que ela procura avaliar os métodos de dominação na sociedade capitalista e verificar a hipótese de emancipação no ambiente de trabalho e na sociedade. A defesa da dissertação do Mestrado em Direito da Uninter ocorreu no último dia 15 de fevereiro, no Campus Garcez.
“A hipótese da dissertação é a de que a possibilidade de emancipação se dê na linguagem, quando, por meio de práticas de diálogo, o indivíduo alcança a condição de sujeito, podendo se tornar sujeito-ator na sociedade”, relata Marilis. Por que “a palavra”? Palavra é o signo que permite o diálogo entre dois ou mais sujeitos, ligando-os à sociedade e os inserindo na cultura. É nesse espaço de interação e diálogo que o indivíduo pode tomar consciência das interpelações ideológicas que o submetem, e romper com o discurso dominante, criando um novo, mobilizando a ação.
“Essa ação é política, porque implica no embate entre forças opostas e intenção de mudar o estado das coisas. Ela pode ocorrer dentro da empresa, quando o trabalhador parte da simples execução para a concepção do trabalho, criando e alterando regras técnicas ou normatizações. Quando o indivíduo se torna um sujeito autoconsciente e cria um novo discurso, transformando seu núcleo de pertencimento e o social”, explica a advogada.
A banca foi composta por Dr. Daniel Ferreira, coordenador do Mestrado em Direito da Uninter, pelos professores do curso Dr. Celso Luiz Ludwig, Dr. Luiz Fernando Coelho, Dr. Doacir Gonçalves de Quadros. Além do convidado externo, Dr. José Affonso Dallegrave Neto.
Marilis relata que, em muitos casos, as normas do direito favorecem os interesses dos grupos econômicos dominantes, a existência de um discurso predominante na sociedade. Com um ambiente democrático, é possível validar normas que não são concebidas pelo legislativo. O que pode abrir espaço para discussão em locais como câmaras arbitrais, tribunais desportivos e observatórios. “Isso constitui uma prática mais deliberativa, que é uma proposta de emancipação da sociedade, o que tem total relação com o agir comunicacional desenvolvido por Habermas”, relata a mestranda.
No que diz respeito à emancipação social ela relata que, habitualmente, as normas do direito favorecem os interesses de grupos dominantes, mantendo sua hegemonia na sociedade. As práticas de debate fomentam um ambiente mais democrático, pois possibilita validar normas que não são as estatais, mas que com elas vão conviver harmoniosamente. É o que ocorre em câmaras arbitrais, comissões de fábrica, tribunais desportivos, observatórios, etc. Lembrando que as leis federais são concebidas pelo legislativo, e o Executivo cria medidas provisórias e decretos. “A prática dialógica deliberativa, assentada na teoria do agir comunicativo de Habermas, é um dos caminhos para a emancipação da sociedade”, comenta a estudante.
Marilis adverte, contudo, que a prática dialógica tem por base o consenso. Nas situações de discordância, como as vivenciadas pelos grupos sociais com menor espaço, ela fica submissa nas éticas discursivas que limitam as condições para a ação (relação fins e meios), para a luta por seu reconhecimento jurídico e estima social.
E a emancipação econômica?
A pesquisa partiu dos conceitos de alienação e emancipação de Karl Marx, sociólogo que viveu no século XIX, que tem uma visão crítica sobre o capitalismo, enxergando a luta de classes como ação transformadora da sociedade. Marx, via a emancipação somente com a socialização dos meios de produção sem vínculo de posse, impossível no capitalismo. Nele, o projeto emancipatório estava atrelado às forças produtivas como totalidade, pois condicionavam o desenvolvimento da história da humanidade.
Jürgen Habermas, pesquisador da escola de Frankfurt, também é estudado na dissertação. Habermas, em sua teoria crítica rompeu com esse determinismo econômico, dizendo que o processo emancipatório se dá no conhecimento, não apenas no saber técnico, mas na consciência prático-moral, com base em valores éticos, desenvolvido a partir de novos espaços de interação, cujas estruturas simbólicas são: sociedade, cultura e personalidade.
Nas práticas político-comunicativas os indivíduos obtêm reconhecimento recíproco, e se tornam sujeitos, o que possibilita que construam um novo discurso ou não se deixem objetivar, opondo-se ao sistema político-econômico-social vigente.
Essas novas experiências individuais ou coletivas podem desencadear novas maneiras de articular a atividade humana e capital, distintas do lucro, voltadas à cooperação, ao compartilhamento e à solidariedade. Essas experiências comunitárias de associativismo e economia solidária, que hoje coexistem com práticas capitalistas, ou até mesmo outras formas podem surgir e, a longo prazo, mudar o atual sistema ou constituir um novo.
Autor: Evandro Tosin – Estagiário de JornalismoEdição: Mauri König / Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Evandro Tosin - Estagiário de Jornalismo