O jusfilósofo que mudou as leis em favor dos “loucos” e dos “menores”
Cerca de 23 milhões de pessoas sofrem com doenças mentais no Brasil, ou seja, 12% da população brasileira, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 192 mil adolescentes em conflito com a lei cumpriram medidas socioeducativas em 2016. Se ainda estivéssemos no século 19, essas pessoas teriam o mesmo tratamento que os demais brasileiros na Justiça.
Essas distorções só começaram a ser debatida no Brasil graças a um homem, o jusfilósofo Tobias Barreto de Menezes. Ele foi o primeiro a questionar a respeito dessas incongruências e propôs mudanças ainda no século 19. Mas as alterações só passaram a ser aplicadas no século 20, com a aprovação do Código Penal de 1940, com uma perspectiva mais humana e social.
“Ele contribuiu para o social, se preocupou com a questão da pobreza, escravidão, do menor [menoridade penal] e do louco [indivíduos com perturbações psíquicas] no Direito. Eram pessoas esquecidas pelo Direito. Um sujeito preocupado com a sociedade pela origem dele”, explica Bruno Krüger Pontes, que defendeu a dissertação “Tobias Barreto de Menezes – o jusfilósofo transformador do direito brasileiro no século XIX” no curso de Mestrado Acadêmico em Direito da Uninter. Jusfilósofo é a pessoa que defende a lei, possui entendimento da lei, mas não executa a função jurídica.
A pesquisa é uma homenagem a Tobias Barreto de Meneze, nascido em 1839 no estado de Sergipe. Em 1846, mudou-se para Recife entrou na faculdade de Direito. Concluiu os estudos em 1869 e foi criador do movimento intelectual denominado a Escola do Recife.
“Ele [Tobias] é talvez o maior jurista do século 19. Um dos responsáveis pela transição de um pensamento jurídico verdadeiramente moderno. Tínhamos um pensamento muito intelectual e pouco preocupado com a realidade prática. Muito influenciando por teorias positivistas da Europa, e acaba mudando isso. A teoria construída por ele vai influenciar o pensamento jurídico do início do período da República e pelo menos até a década de 1930”, explica Walter Guandalini, professor de Direito na Universidade Federal do Paraná.
Na segunda metade do século 19, Tobias publicou artigos e poesias nos jornais, estudou a língua alemã, e depois lecionou e aprendeu filosofia. Revolucionário e crítico, modificou a cultura nacional. Mesmo não exercendo a advocacia de fato, era conhecedor das leis, estava à frente de seu tempo. Publicou o livro Menores e Loucos em Direito Criminal. O escritor faleceu em 1889. “Tobias Barreto fica um pouco esquecido, acabamos estudando os filósofos europeus”, afirma Bruno.
Tobias foi importante no período de transição do Brasil Império para a República, um momento efervescência cultural no país, principalmente no Direito e na Filosofia. Era uma época em que estavam surgindo faculdades de Direito no Brasil, e acontecia o rompimento com Portugal. O filósofo foi precursor no nacionalismo brasileiro e apresentou reflexões importantes. Tinha uma concepção bem definida: “Vamos parar de emprestar de Portugal toda a nossa cultura e ciência”, lembra o mestrando.
O historiador Paulo Mercadante, falecido em 2013, escreveu a biografia Tobias de Barreto: o feiticeiro da tribo. “Ele colocava as ideias em um caldeirão e botava para ferver”, diz Bruno.
Autor: Evandro Tosin – Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König