O Dia do Trabalho nunca mais será o mesmo depois do coronavírus

Autor: Mauri König

Nada será como antes depois de passar a pandemia de coronavírus, inclusive nas relações trabalhistas e no modo de produção de algumas atividades profissionais. Por isso, neste 1º de maio, Dia do Trabalho, as comemorações serão bastante atípicas. A data que significa um marco na luta por melhores condições de trabalho, neste ano vai exigir uma forçosa reflexão sobre como se darão as relações de trabalho daqui para frente.

As mudanças começaram antes mesmo de a Organização Mundial da Saúde declarar estado de pandemia, o que ocorreu em 11.03.2020. Já se fazia ideia da extensão do problema. Assim, muitas decisões legislativas que mexeram com as relações trabalhistas no Brasil vieram no lastro da Lei nº 13.979, de 06.02.2020, que dispõe sobre as medidas a serem adotadas no enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus.

Em 20.03.2020, o Congresso Nacional declara estado de calamidade pública em todo o território nacional, e dois dias depois a Medida Provisória nº 927 traria os primeiros instrumentos de mudanças concretas nas regras trabalhistas, permitindo aos empregadores adotarem as seguintes medidas:

  • o teletrabalho;
  • a antecipação de férias individuais;
  • a concessão de férias coletivas;
  • o aproveitamento e a antecipação de feriados;
  • o banco de horas;
  • a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
  • o direcionamento do trabalhador para qualificação;
  • o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.

Apesar da série de críticas à MP 927, por mexer de forma tão profunda em direitos trabalhistas há muito conquistados, no dia 01.04.2020 entrou em vigor a Medida Provisória nº 936, mais polêmica ainda por que prevê a possibilidade de redução de jornada de trabalho e a redução proporcional de salários, além de justificar a suspensão de contratos de trabalhos.

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a constitucionalidade das medidas da MP 936, dada a excepcionalidade de uma pandemia e suas consequências negativas na sociedade. Contudo, o empregado passou a ter o direito de receber uma compensação pela perda ou redução temporária de salário, a ser paga pelo governo federal por meio do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm), previsto na própria MP 936.

Na sequência, a Portaria nº 10.486, de 22.04.2020, define os procedimentos relativos à comunicação ao Ministério da Economia no caso de acordos realizados para suspensão contratual ou redução salarial. A Portaria atribui ao empregador o lançamento das informações no sistema e incumbe ao empregado o fornecimento correto dos dados, inclusive no caso de impedimento para receber o BEm.

Nova mudança ocorreria com alterações em dois artigos da MP 927. Em sessão realizada por videoconferência em 29.04.2020, os ministros do STF decidiram por maioria de votos suspender o artigo 29, que não considera doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pelo coronavírus, e o artigo 31, que ​limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho à atividade de orientação.

As mudanças produzidas por essas leis, MPs e Portarias foram específicas à esfera trabalhista, mas, além disso, uma série de determinações estaduais e municipais impactaram as relações de trabalho, mediante, por exemplo, o fechamento temporário ou a restrição de funcionamento de atividades consideradas não essenciais.

Ainda estamos nos acostumando às turbulências provocadas pelo Covid-19, cheios de incertezas sobre como sairemos dessa pandemia. Uma das poucas certezas trazidas pelo coronavírus é que algumas das mudanças com as quais ainda estamos nos habituando vieram para ficar. Possibilidades estão se abrindo, para empregados e empregadores, ainda que se possa identificar perdas de um lado e de outro.

Ainda não é possível afirmar quanto dessa flexibilização das relações trabalhistas vai perdurar, mas o home office e outras medidas dessas MPs e Portarias, que reforçam a reforma trabalhista aprovada em 2017, vão impactar o mundo do trabalho. Esse impacto deverá ser percebido também nas pautas de negociações entre patrões e empregados, que são postas em evidência exatamente no Dia do Trabalho.

Mais de 90 países comemoram o Dia do Trabalho em 1º de maio, dia em que 4 operários foram mortos pela polícia de Chicago (EUA), em 1886. A tragédia se deu em meio a campanhas de operários em todo o país por melhores condições de trabalho, que, entre outras reivindicações, pediam jornada de trabalho de 8 horas diárias, pois alguns operários trabalhavam até 14 horas. A data comemorativa foi escolhida em 1889 pela Segunda Internacional Socialista, congresso que reuniu em Paris os principais partidos socialistas e sindicatos da Europa.

Embora ainda hoje as reivindicações sejam por melhores salários e melhores condições de trabalho, as próximas edições do Dia do Trabalho possivelmente serão diferentes depois do coronavírus. Resta torcer para que não ocorram em meio a uma nova pandemia.

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Autor: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Domínio publico/Wikimedia Commons


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