Mês da Bíblia com o livro do profeta Ezequiel

Profeta Ezequiel, do mestre Aleijadinho (Congonhas-MG).

Há 53 anos a Igreja Católica, por meio da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, elegeu setembro como Mês da Bíblia, em homenagem ao patrono das Sagradas Escrituras, São Jerônimo (comemorado em 30/09 – Dia da Bíblia Católica). Este mês temático apresenta um objetivo pastoral: propagar e aprofundar estudos sobre os escritos bíblicos junto das comunidades cristãs católicas brasileiras.

A animação bíblica das comunidades ocorre por meio da escolha de um livro anual para estudo, alternadamente entre os livros do Antigo e Novo Testamentos. Para este ano de 2024, o livro escolhido foi o de Ezequiel: o terceiro livro profético na ordem atual dos profetas do Antigo Testamento das bíblias. O nome “Ezequiel” significa “El (Deus supremo) é forte” ou “que Deus fortaleça”.

No contexto histórico do escrito, Ezequiel tem como pano de fundo o exílio da Babilônia, ocorrido no século VI a.C. Período em que houve deslocamento da referência social, religiosa e nacional dos israelitas por cerca de meio século. Além de todas as implicações sociais e políticas, a deportação gerou uma crise religiosa para o povo: a fé de Israel estava ligada à terra recebida em promessa e à aliança com um Deus guerreiro.

Segundo Marileda Baggio, nas migrações forçadas há ambiente propício para que se percam as raízes, os vínculos e as ligações afetivas. Não há tempo para uma migração planejada, podendo ser uma crise de espiritualidade na divindade. É importante nestes eventos o surgimento de lideranças com vozes de esperança em meio ao ambiente de instabilidade, aqui ganham proeminência os profetas escritores do período: Jeremias, Lamentações e Abdias, que narram a perspectiva de junto dos que ficaram na terra dominada e os exilados Dêutero-Isaías (Is 40-55) e Ezequiel que profetizam junto dos deportados na Babilônia.

O padre e pesquisador Shigeyuki Nakanose destaca na introdução da Bíblia Nova Pastoral que Ezequiel é profeta de origem sacerdotal, de atuação na corte e que prega temas semelhantes aos do primeiro Isaías: Deus de Israel (poderoso, glorioso e transcendente); Davi como protótipo ideal de rei; monarquia e liderança davídica defensora da justiça; reunificação de Judá (Sul) e Israel (Norte) e reconhecimento divino nacional “Eu sou Javé” (Ez 7,9). Nakanose registra ainda a seguinte proposta de organização dos 48 capítulos da obra profética:

  • Vocação do profeta (capítulos 1,1-3,21)
  • Oráculos sobre a destruição de Jerusalém (capítulos 3,22-24,27)
  • Oráculos contra as nações (capítulo 25-32)
  • Oráculos de salvação para Israel (capítulo 33-39)
  • Visão da Nova Jerusalém e do povo restaurado (capítulo 40-48)

Para a irmã Zuleica Silvano, “O estudo do Livro de Ezequiel visa uma tomada de consciência do papel profético de cristãos e cristãs ou de pessoas interessadas em viver a vontade de Deus […] denunciando as injustiças e anunciando a novidade do amor de Deus […] despertando a esperança, para consolar aqueles e aquelas que experimentam a perda, o sofrimento, a aflição, de forma especial os ‘exilados’ e ‘exiladas’ de sua terra por causa das guerras ou as pessoas em busca de melhores condições de vida”.

O livro apresenta para nossos dias uma atualidade de interpretação. Se Ezequiel alertou e “esperançou” seus contemporâneos, sua palavra ressoa hoje com força renovadora para uma Igreja servidora, profética, em saída, sinodal e que nasce do vigor batismal. Ilumina o texto profético:

“Derramarei sobre vós uma água pura e vocês ficarão purificados. Purificarei vocês de todas as suas imundícies e de todos os seus ídolos. Darei a vocês um coração novo e colocarei um espírito novo dentro de vocês. Tirarei o coração de pedra e lhes darei um coração de carne. […] Vocês serão o meu povo, e, eu serei o Deus de vocês!” (Ez 36,25-26.28b).

Desejo que, com a leitura do profeta, o Mês de Setembro de 2024 seja uma oportunidade de contato, estudo e aprofundamento da espiritualidade que brota da Palavra de Deus e inspira toda a vida. Que Deus fortaleça!

* Prof. Márcio José Pelinski, mestre em Teologia (Exegese e Teologia Bíblica) pela PUC-PR; professor do Bacharelado em Teologia Católica da Uninter; diácono permanente na Diocese de São José dos Pinhais (PR); assessor pedagógico da Comissão Nacional de Diáconos (ENAP-CND/CNBB).

Referências e obras para aprofundamento

Bíblia Pastoral. Nova Edição. São Paulo: Paulus, 2014.

BAGGIO, Marileda. Quando diferença e acolhida se encontram: Igreja e Migrações. Teocomunicação, v. 44, n. 2, pp. 262-280, 2014.

Comissão Episcopal para Animação Bíblico-Catequética da CNBB (Org.). Mês da Bíblia 2024 – Livro de Ezequiel: texto-base. Brasília: Edições CNBB, 2024.

NAKANOSE, Shigeyuki. In. Bíblia Pastoral. Nova Edição. São Paulo: Paulus, 2014.

PELINSKI, Márcio José. A vocação para o direito e a justiça no primeiro canto do servo de YHWH. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba, 2021. 148 p.

ROSSI, Luiz Alexandre Solano. Livros Proféticos e Sapienciais: profecia e sabedoria para bem viver. Curitiba: Intersaberes, 2019. (Série Princípios de Teologia Católica).

SILVANO, Zuleica Aparecida (Org.). Livro de Ezequiel – “eu vos darei um coração e um espírito novo” (Ez 36,26). São Paulo: Paulinas, 2024.

SCHÖKEL, Luís Alonso; SICRE DIAZ, José Luís. Profetas I. São Paulo: Paulinas, 1988.

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Créditos do Fotógrafo: http://acervodigital.unesp.br/handle/unesp/252157


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