Infância: fonte de aprendizado e desenvolvimento emocional

Autor: Daniela Mascarenhos - estagiária de jornalismo

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define que eles são seres dignos de respeito. Mesmo assim, nossa cultura por vezes ainda insiste em olhar para a criança como um ser à parte de tudo. Alguém que não entende, que não escuta, esquece rápido.

Ao contrário desse entendimento, é na infância que a criança recebe sua maior fonte de aprendizado. Do zero aos seis anos, temos a base que será levada para toda a nossa vida. Dos sete aos 12, aperfeiçoamos tudo o que foi desenvolvido por meio do afeto e do respeito, principalmente. Nesse cenário, compreende-se a família como um dos fatores primordiais para que dali surja um futuro adulto responsável com ele mesmo e com os demais.

Segundo a especialista em neurociência, educação e desenvolvimento infantil Gabriela Arruda, embora os conflitos façam parte do dia a dia, o respeito deve prevalecer. “Uma criança que cresce em meio às brigas dos pais ou que os pais mantêm o casamento só por ela, vai desenvolver uma ideia conturbada do que é uma família. Ou, até mesmo, brigas frequentes de familiares, a violência física, verbal e até psicológica influenciam e muito no futuro daquela criança”.

Gabriela pontua que hoje os casos mais recorrentes são os de violência verbal e psicológica: “Embora não se considere, é violência sim! Um pai ofender, humilhar, constranger, ameaçar ou chantagear uma criança, é um tipo de violência psicológica”.

Uma criança que convive com a constante repetição desses atos, tende a crescer com menor aptidão no controle das suas emoções, “ela vai estar sempre com medo, insegura e isso afeta também o desenvolvimento cognitivo dela, assim como sua parte de socialização e tantos outros fatores”, complementa a especialista.

Muitas vezes o comportamento de uma criança é visto como uma birra ou falta de educação. Já de acordo com Gabriela, “o que ninguém pensa é que essa pode ser a forma de comunicação dela. O jeito que ela encontrou de dizer que não está bem, que não está gostando ou que não se sente importante. É tudo feito com a intenção de chamar a atenção de alguém para si. Esperando que alguém olhe, não rotule e atenda às necessidades dela”.

Elas compreendem ou apenas escutam?

“Eu já vi casos em que a pessoa lembrava de fatos que aconteceram aos seus dois anos de idade. Não se sabe ao certo se realmente tinha essa idade, mas a criança já capaz de perceber e sentir situações de conflito desde o útero”, explica a especialista.

Já é provado cientificamente que crianças são como esponjas, absorvendo tudo ao seu redor. Embora os adultos também possam ter percepções de quando o clima está mais pesado ou algo acabou de acontecer, com o passar dos anos uma espécie de bloqueio se desenvolve. No caso dos pequenos, estão sempre abertos.

Agora, em questão de compreender o que ela está presenciando, “depende muito da maturidade dela, por exemplo, um bebê pode estar no carrinho sem entender nada, mas ele pode sentir a agressividade no ambiente e vai chorar por não saber compreender aquilo”, diz.

O nível de toxidade em um ambiente pode ser prejudicial em diferentes níveis para uma criança: desde o atraso cognitivo, fobia social e má interpretação dos próprios sentimentos, que pode levar à gagueira, transtornos psicológicos, etc. Após os seis anos, essas dificuldades podem afetar sua leitura, fala e aprendizagem de forma geral.

Adultos despreparados geram crianças subestimadas

Segundo Gabriela, “os pais têm o costume de achar que ela [a criança] não é capaz de entender, de compreender, mas é um grande engano. Ela precisa do adulto preparado para guiar seu aprendizado, mas nunca ser subestimada”.

“A gente precisa olhar para a criança como um ser capaz de resolver conflitos, capaz de se superar e de aprender as coisas, mesmo que com a gente ao lado conduzindo e guiando”, explica.

O melhor a se fazer, de acordo com Gabriela, é manter um diálogo aberto com a criança respeitando seu nível de maturidade, independente do assunto. “Se a criança é muito pequena e o assunto é relacionado à morte, por exemplo, é preciso usar da ludicidade e colocar aquilo de uma maneira que ela consiga visualizar. Mas ela precisa passar pela dor, dizer tchau pro animalzinho ou familiar que partiu. Ou no caso do divórcio, ela precisa saber que os pais nunca vão deixar de amá-la, se conectar com ela, mas que agora eles não estão mais juntos entre eles”, complementa.

A falta de diálogo resulta na não compreensão de ambos os lados, no entanto, a maior afetada é a criança. Já que, por não saber se expressar ou lidar com aqueles sentimentos, muitas vezes ela segue pelos caminhos errados e resulta em rótulos como “você está impossível”, “não sei mais o que faço com você”, ou simplesmente assumir aquilo como uma birra.

Essas situações vão se refletir lá na frente. Quando, por exemplo, a criança mais introvertida se torna um adulto perfeccionista que quer agradar sempre e sente dificuldade em confiar nas pessoas. Já a criança extrovertida tende a se rebelar, o que traz a autossuficiência, o sentimento de não precisar de ninguém, a resistência em lidar com problemas, etc.

O papel da família

Seja uma dificuldade para tirar a criança da fralda ou até mesmo extinguir o uso da chupeta, o problema muitas vezes acaba sendo bem mais profundo. “A criança é um reflexo do ambiente”, diz a especialista.

“A criança é capaz até mesmo de mudar questões genéticas se ela recebe um lar com amor e com liberdade, mas com responsabilidade. Não com permissividade, mas com respeito.  O adulto tem que estar preparado para isso”, complementa.

A nossa cultura tende a rotular os pequenos, com “criança tem que ter limites” ou até mesmo que usar da violência física é a resposta. De acordo com Gabriela, “a gente esquece de olhar para esses comportamentos como uma comunicação. E se a gente aprendesse a olhar para as crianças com respeito e dignidade, e buscar entender o mau comportamento como uma imaturidade cognitiva, com certeza muitos conflitos poderiam ser evitados”.

Segundo Gabriela, “é preciso estudar para educar”. De acordo com a especialista, as pessoas têm a ideia errada de que quando nasce uma criança, também nasce uma mãe. Mas é tudo uma questão de evolução, de saber reconhecer os erros e buscar melhorar. O importante é que os pais saibam olhar para sua infância, para que possam compreender os filhos.

Um outro fator importantíssimo para o desenvolvimento infantil, é o tempo de qualidade. “Hoje os eletrônicos têm roubado esse tempo, os pais passam muito tempo nos celulares e as crianças ficam ali com a falsa atenção, observando seu tempo ser dividido”, explica.

“A gente se desenvolve na medida em que somos estimulados e quando a criança recebe amor, respeito, tempo de qualidade, zelo, entre outros fatores, isso é um prato cheio para que ela possa transbordar por ela mesma. Necessidades básicas são importantes? Sim, claro. Mas as necessidades socioemocionais são tão importantes quanto”, conclui.

O tema foi abordado durante o programa Fala, Prof. exibido pela Rádio Uninter. As professoras Talita Cabral e Relly Amaral receberam a especialista em neurociência, educação e desenvolvimento infantil Gabriela Arruda para apresentarem a visão da criança diante dos conflitos familiares.

Para assistir à transmissão completa, clique aqui.

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Autor: Daniela Mascarenhos - estagiária de jornalismo
Edição: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Cottonbro/Pexels


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