Fome e desemprego devem aumentar muito após a pandemia

Autor: Fillipe Fernandes - Estagiário de Jornalismo

Estimativas apontam que em torno de cinco milhões de brasileiros estejam passando fome, o relatório The State Of Food Security and Nutrition In The World (O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo, em livre tradução) divulgado em 2018 pela ONU registra esse dado alarmante. A pandemia de Covid-19 continua afetando a economia, fechando postos de trabalho e, consequentemente, impossibilitando o acesso das pessoas à alimentação.

A fome e o desemprego estão mais relacionados do que pode parecer à primeira vista. Para debater o momento atual do Brasil e para onde podemos caminhar em relação a essas temáticas, a professora Cleci Elisa Albiero, mediou uma mesa de debates com o tema Fome e desemprego no pós-pandemia, que fez parte da 1ª Maratona de Saúde Uninter.

Os professores Dorival da Costa, coordenador do curso de Serviço Social, Neiva Silvana Hack, professora do curso de Serviço Social e a pesquisadora na área de nutrição, Márcia Suss, promoveram uma conversa para expor essa mazela que, infelizmente, não é uma novidade da pandemia em nosso país. Você pode acessar a íntegra do encontro clicando aqui.

O começo da discussão se deu com o professor Dorival, que fez um panorama da produção de alimentos através dos tempos. “Nós podemos dizer que através do trabalho, apesar do trabalho no capital não estar voltado para solução da necessidade do ser humano, o homem teve condições de ter uma produção de alimento com qualidade, independentemente de sua região mundial”.

Falar de fome é importante, pois o tema permite construir sociabilidade. Dorival explica que o homem conseguiu os avanços na produção de alimentos, graças a ciência. “O homem foi capaz de transformar a natureza, muito pela ciência. A ciência não é coisa nova. O ser humano foi construindo possibilidades de produzir alimentos. Essa é a perspectiva da fome enquanto capacidade do homem de resolver a sua necessidade de sobrevivência e da sua sociabilidade”, explica.

Márcia Suss apontou o principal problema trazido durante a conversa: a distribuição dos alimentos produzidos. “Algumas correntes dizem que para acabar com a fome no mundo é necessário aumentar a produtividade. Assim, a segurança alimentar é construída dentro de uma perspectiva neoliberal. Para solucionar a fome, seria preciso desenvolver e sociabilizar essa tecnologia de produção. Isso não ocorre, pois, um pequeno grupo de grandes empresas detém a tecnologia e controlam a produção. Concentrando a produção de um único item pelo seu valor de mercado”, expõe.

“O grande debate é como acabar com a fome no mundo. A fome realmente ameaça nossa espécie. Alimentação é um direito humano. A declaração universal dos direitos humanos diz em seu artigo 25 que todas as pessoas têm direito à alimentação de forma contínua, pois ela assegura a vida”, explica a pesquisadora convidada, mostrando que os conflitos empresariais estão diretamente relacionados à fome no planeta.

O entendimento de que a alimentação é um produto e não um direito, complica as possibilidades de erradicação da fome. “O problema não está na produção, na quantidade de produção que é gerada anualmente. E sim no fato de que as pessoas, para poderem acessar esses alimentos, tem que dispor de recursos financeiros. Ou seja, o nosso direito humano e sagrado à alimentação é transformado em mercadoria. Se você tem dinheiro para pagar, muito bem. Se não, você não tem acesso”, comenta Márcia.

As grandes corporações, além de produzirem alimentos visando sua mera conversão em commodity, são responsáveis por práticas agrícolas predatórias, que afetam o ar, solo e a água. Primordialmente, essa degradação do meio ambiente ocorre em países em desenvolvimento, pois os países desenvolvidos normalmente compram a produção dos países de terceiro mundo e emergentes pelo baixo custo.

A pesquisadora Márcia comenta que a solução da fome passa pela soberania alimentar, que é um conceito que entende o alimento como direito humano. “Para que um país consiga resolver o problema da fome, ele deve ter uma valorização das culturas locais. Que esse trânsito de alimentos de um país para o outro seja exterminado. Cada um deve assegurar o acesso à alimentação de seus cidadãos. Ser independente em relação à produção de alimentos”.

A convidada ainda pontua que apenas 25% do território agrícola do país é utilizado para produção de alimentos e pela agricultura familiar, pauta que é abraçada por movimentos como o MST (Movimento Trabalhadores Rurais Sem Terra) no Brasil.

Neiva continuou o debate trazendo dados atualizados do desemprego no país. “O alimento se transformou em mercadoria. É preciso pagar por ele. Logo, discutir a fome quer dizer discutir acesso à renda, como que eu vou ter acesso a esses alimentos? Por isso é importante a questão do emprego, do trabalho. Os indicadores nos fazem um alerta”.

Segundo dados da PNAD Covid-19, pesquisa publicada pelo IBGE no mês passado, 13,7% da população brasileira está desocupada. E 18,5 milhões de pessoas não procuraram trabalho por causa da pandemia ou por falta de trabalho em sua localidade. Quando se somam as pessoas desocupadas e com funções subutilizadas (que trabalham sem vínculo empregatício e garantias básicas), o país tem 36 milhões de brasileiros em situação vulnerável.

Leis como a 11.346/2006, que criou o SISAN – Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional auxiliaram na luta contra a fome, mas se mostram insuficientes para lidar com o problema. “Nós já resolvemos a capacidade de produção dos alimentos pela ciência. A fome agora é uma decisão política e nós temos que lutar por isso”, explica Dorival.

Neiva complementa: “Precisamos de planos efetivos para inserção das pessoas no mercado de trabalho e proteção do trabalho. Transformar o acesso a renda em direito”, essa pode ser uma saída para essa questão tão urgente. A fome é mais uma epidemia em andamento no Brasil.

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Autor: Fillipe Fernandes - Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Kasun Chamara/Pixabay


2 thoughts on “Fome e desemprego devem aumentar muito após a pandemia

  1. Matéria muito importante e de cortar o coração. Nas cidades, cada canteiro, cada calçada deveria ser uma horta pública agroecológica a céu aberto. é inadmissível que um país tão rico e com tanta terra fértil tenha gente passando fome. No campo, a primazia deveria ser a alimentação da população e não a plantação para alimentar o gado – agronegócio (interno ou dos demais países).

  2. Agora, em março de 2021 dentro das propostas do movimento ecológico e de cidadania estamos divulgando campanhas de distribuição de alimentos, mais uma vez, consideramos estas iniciativas humanitárias, alimentos naturais tão importantes como auxílio emergencial.

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