Desafios das cidades educadoras no enfrentamento do racismo

Autor: Adriane Vasconcelos de Souza - Assistente de Comunicação Acadêmica

Scales of justice equaling races without prejudice or racism. Clipping path included.

É comum visitarmos lugares e inferirmos algum pré-conceito sobre aquilo que vimos. Normalmente, quem conhece uma cidade olha para ela com um olhar generalista, sem lhe dar muita atenção. “Mas a cidade, é muito mais do que um aglomerado de casas e prédios. As cidades são atravessadas por contradições sociais, econômicas e culturais que, num certo sentido, espelham as contradições que constituem a própria sociedade”, é o que aponta o artigo Segregação social e racial na (re)produção do espaço urbano brasileiro: desafios de uma cidade educadora dos autores Ivan Penteado Dourado, Marcio Tascheto da Silva Telmo Marcon e da doutoranda Daniela dos Santos, publicado pela Revista Intersaberes da Uninter, que busca analisar o espaço das cidades na produção e reprodução de segregações socioeconômicas e raciais.

O trabalho problematiza a questão do direito à cidade  por meio de uma revisão bibliográfica e documental. Para isso, busca destacar os desafios das cidades educadoras em meio às segregações, sejam elas: socioeconômica, cultural, política e racial em diferentes espaços, bem como incrementar práticas que assegurem a cidadania.

Para refletir sobre essas segregações, os autores trazem conceitos do racismo estrutural e multidimensional sob diferentes pontos de vista. Para os autores do artigo, tentar compreender o racismo, é mergulhar em narrativas que acompanham a existência da humanidade, buscando identificar a origem das ideias que associaram, por  exemplo, penalidades à cor da pele.

Na obra “Racismo Estrutural”, escrita pelo ministro de Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio Lual de Almeida, o racismo aparece como uma forma de discriminação baseada na raça e que se manifesta de forma consciente ou inconsciente resultando em “desvantagens ou privilégios”, a depender do grupo social em questão. A obra ainda discute a diferença de três formas de racismo: individualista, institucional e estrutural.

No individualista, o racismo não estaria vinculado à sociedade ou a organizações, mas sim, nos indivíduos que agem sozinhos ou em grupos. O racismo institucional e estrutural são fenômenos distintos. o estrutural está imbricado nas relações sociais que desfavorecem grupos de acordo com a cor da pele. Já as instituições seriam a materialização dessa estrutura social, tendo o racismo como um de “seus componentes orgânicos”. Logo, o racismo está nas estruturas sociais, ele não tem origem nas instituições, mas é reproduzido por elas.

Outro conceito é o de racismo multidimensional, abordado por Jessé de Souza na obra na “Como o racismo criou o Brasil”. A ideia é que o racismo abrange também componentes de gênero, de raça, classe ou de cultura. Por isso, para pensar o racismo no contexto das cidades, a obra destaca o racismo multidimensional como fruto da moralidade. Cabe destacar os processos de classificação reproduzidos em relação ao juízo que se faz sobre “bairros e favelas em nobres ou desprezíveis, embelezados ou sujos, ricos ou pobres, seguros ou violentos” que possuem um viés moral.

De acordo com o autor, a moralidade é uma reflexão profunda para definir o que é justo no que se refere ao direito à moradia, alimentação, saúde e educação. Como é construída pela elite e passada através da educação pela Grande Mídia e repassada por gerações, essa moralidade acaba sendo reproduzida de forma acrítica. Isso contribui para que haja uma reprodução dessas estruturas sem a devida compreensão de tais implicações de suas práticas na construção das estruturas sociais nas cidades.

A lógica capitalista pela acumulação de riqueza acaba desfavorecendo o acesso à moradia por parte das classes mais baixas. Por consequência disso, abre o espaço para cidades mais desiguais, que privilegia uns e exclui grande parte, impondo às classes mais pobres “uma lógica de sobrevivência precária”, sobretudo para a população que vivem nas periferias. De acordo com dados do IPEA (2011), que apontam para 66,2% das casas em favelas sendo ocupadas por pessoas negras – indício da vulnerabilidade desse grupo.

No Brasil, a “probabilidade de ser negro e pobre é muito maior”, destacam os autores. Isso porque as questões de ordem de classe social e de origem étnica estão imbricadas. Isso remonta à história da escravidão e das elites no país. A mentalidade segregatícia permanece, mesmo com a migração para o processo de industrialização.

Como forma de resistir a isso, criam-se os movimentos sociais e elaboração de documentos para a garantia de direitos, entre eles, o direito à moradia digna e a luta contra o racismo estrutural no mundo.

Pensando nisso, no ano de 1990, em Barcelona/ESP, gestores municipais pensando em construir cidades mais democráticas, foi criada a Associação Internacional das Cidades Educadoras (AICE), com a finalidade de melhorar a experiência de vida nos centros urbanos. Diante disso, foram criados vinte princípios “da Carta das Cidades Educadoras (revisada em 2020) na qual os gestores se comprometem a governar levando em consideração tais princípios.

Trabalhar em cima desse compromisso é fundamental para que se construam sociedades mais bem desenvolvidas estruturalmente, inclusive revendo preconceitos e senso moral. Se aplicados e tratados como prioridade, poderemos caminhar para condições melhores nas cidades. Mas, se esquecido esse compromisso, isso continuará sendo um problema no país, concluem os autores.

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Autor: Adriane Vasconcelos de Souza - Assistente de Comunicação Acadêmica
Edição: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Pixabay


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