Covid-19: dilemas educacionais legados
Autor: Antonio Siemsen Munhoz*A chegada indesejada de uma pandemia coloca as pessoas em um estado de aumento da insegurança e da luta por um mundo de incertezas sobre o que poderá acontecer em um novo tempo. Alguns questionamentos estão sendo colocados. Eles necessitam de respostas ágeis e eficazes.
Há um grupo de educadores de diferentes matizes que está analisando a possibilidade de que a tecnologia venha a auxiliar a educação nas séries iniciais. A caminhada da educação infantil na trilha que conduz da presencialidade para a virtualidade sempre foi combatida. Este combate reuniu diferentes fontes: pais e mães; pedagogos com diferentes áreas de especialização, que incluem temas de viés social, filosófico e psicológico; e as próprias instituições de ensino.
Todos assumiram posições dicotômicas sobre o tema, independentemente da escola de pensamento adotada. Poucos foram os debates que não terminaram de forma acalorada. Frente à pandemia algumas posições mudaram radicalmente. Não se sabe ainda precisar se isto ocorreu para obtenção de vantagens sociais nas áreas econômica, política ou profissional. O certo é que antigos detratores se tornam defensores fervorosos de uma decisão que não pode ser considerada como algo fácil de ser tomado.
As pessoas não precisam ir muito longe para comprovar o fato. Basta olharem para seus próprios familiares e perceber o problema que o isolamento social tem causado nas crianças. O clima se transforma. Crianças antes calmas (apáticas segundo outras visões) se tornam agressivas ao serem separadas do convívio social de sua “turma ou tribo”.
A presencialidade sempre exigida como elemento de socialização, o único para muitas crianças, se reafirma como uma necessidade. Se estivéssemos pesando efeitos nos pratos de uma balança, no outro lado, a permanência quase como uma constante de um meio ambiente agressivo ao homem, que terá que lutar antes por sua sobrevivência, do que pela evolução de novos conhecimentos em busca de atingir o “Welfare State”, coloca esta situação como irreversível.
Estamos assistindo uma tragédia anunciada, não somente em visões apocalípticas, nem como na rica ficção que já levou o homem a inimaginados pontos distantes em nosso universo. O esgotamento dos recursos do planeta é uma caminhada por uma estrada de mão única que pesa bastante no outro lado da balança. Isto pode calar parte da plateia contrária ao revelar uma necessidade de defesa que somente poderá ocorrer em um bunker familiar, como acabará por se tornar o lar de cada pessoa. Se há a necessidade da formação de uma geração de pessoas preparadas para o enfrentamento destes novos tempos ela deve começar agora.
É preciso aceitar a irrefutabilidade desta realidade, o que não será uma tarefa fácil. Nossos educadores devem ser preparados para isto, mesmo que seja necessário que aceitem quebrar crenças arraigadas. Elas devem não apenas ser varridas para baixo do tapete, mas queimadas até virarem cinzas. O que começou como uma tarefa difícil para muitos – defender a educação semipresencial ou não presencial para as crianças – pode encarreirar um grande número de adeptos.
Eles serão bem-vindos, desde que não sejam resultado de nenhuma espécie de proselitismo. A hora é de efetivação do raciocínio crítico e de olhar para o mundo ao redor como um elemento que parece estar colocado a revidar todos os sofrimentos que o elevado consumismo humano lhes impôs. Antes isto do que deixar escapar, por alguma brecha, a teoria da conspiração que considera estarmos sofrendo tudo o que estamos sofrendo devido a uma guerra branca que pode destruir seres humanos, mantendo intacto o resultado de seu desenvolvimento e crescimento científico.
Fizemos a diversos professores, antes de a pandemia ser sequer uma situação imaginável, a seguinte pergunta: a educação não presencial pode ser adotada para as séries iniciais? A motivação era a mesma: preparar a criança para o mercado futuro, considerando o excessivo número de analfabetos digitais.
A resposta imediata foi posta como contra-argumento apontando para o fato que muitas (a maioria) das crianças não tinham acesso ao ferramental necessário. Mas a força da sobrevivência é mais forte. Há um contra-argumento irrefutável: se nada se fizer para evitar o trânsito livre das crianças poderemos estar criando um exército de vetores transmissivos, a matar as pessoas mais velhas da família. Ele parece vencer todas as resistências.
Desta forma, a reaplicação do questionário obteve resultados contrários àqueles que foram obtidos na primeira vez. Frente a esta situação, o que resta de mais importante é que, uma vez decidido que as crianças devem seguir por uma caminhada pelas alamedas virtuais na educação infantil, ela seja efetivada de forma totalmente diferenciada e que o acesso seja democrático. Soluções paliativas não se aplicam a uma situação que parece ser definitiva. Se isto não for pensado, poderemos estar aumentando de forma exponencial a exclusão social com o aumento do número de analfabetos tecnológicos.
Governo, escolas, professores e a sociedade devem irmanar as intenções e deixar de lado riscos que existem nesta caminhada, tais como a criação de uma tecnocracia e a fuga em direção a um governo mundial. Mais uma vez uma tragédia anunciada colore com cores pesadas o horizonte futuro. Antes de analisar se devemos ou não adotar a não presencialidade na educação infantil, devemos estar preparados para saber se podemos dar conta de tal tarefa, adquirir as condições que faltam para preencher esta lacuna e somente então, dar sequência para a vitória sobre o gigantismo de tal tarefa. É preciso que as pessoas não fujam desta confrontação e que as discussões não estejam limitadas a aspectos pontuais superficiais, mas considerem em sua abrangência a amplitude de analisar propósitos sociais, econômicos, políticos e aspectos didáticos e pedagógicos que tal medida possa vir a provocar.
* Antonio Siemsen Munhoz é docente da área de Tecnologias da Escola Superior de Educação da Uninter.
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