Contra todas as adversidades, Edson sobreviveu e conquistou o diploma de Direito

Autor: Nayara Rosolen

Na Uninter, as limitações são encaradas como oportunidade de melhoria e dedicação para que os estudantes recebam o melhor atendimento e formação profissional. Exemplo disso é a trajetória do egresso Edson Bazam, de 54 anos, que conquistou o diploma do curso de Direito este ano, em Curitiba (PR).

Edson é tetraplégico desde os 13 anos de idade, mas a condição nunca o impediu de viver nenhuma experiência. No centro universitário, o trabalho realizado pelo Serviço de Inclusão e Atendimento aos alunos com Necessidades Educacionais Especiais (SIANEE) foi fundamental para garantir o suporte necessário durante os estudos.

O resultado do trabalho conjunto se deu no último dia 16 de abril, na solenidade de colação de grau, que aconteceu na Ópera de Arame da capital paranaense.

“A admiração e respeito, por parte daqueles que me conhecem e daqueles que ficam sabendo que sou bacharel em Direito, são notórios. Sempre ficam de olhos arregalados ao saberem disso. O curso trouxe uma maior e melhor visão de mundo e de como é importante saber nossos direitos”, afirma o egresso.

A coordenadora do SIANEE, Leomar Marchesini, conta que, desde a entrada na instituição, Edson demonstrou determinação e ânimo no enfrentamento das dificuldades, “superadas com maestria”.

“Sempre confiante em si mesmo e no trabalho do SIANEE, comunicava suas necessidades e algumas vezes nos sugeriu recursos, em uma produtiva parceira. Sempre muito educado, cordial e universitário dedicado, levando extremamente a sério a sua formação profissional. Esteve seriamente enfermo no final do curso, mas nem isto abalou sua vontade de vencer. Considero a formatura do Edson Bazam emblemática no trabalho de inclusão do SIANEE”, salienta Leomar.

 

A luta de Edson para sobreviver 

Edson nasceu em uma região rural, no interior do Paraná, próximo à Pérola (PR). Em 1972, o pai, Arnaldo, que era cafeicultor, resolveu dar outro rumo para a vida da família, pois no sítio que possuía em sociedade com o irmão, Getúlio, passava por muitas privações e o trabalho era pesado. “Arrumou emprego como auxiliar de pedreiro, alugou uma casa humilde e voltou somente para nos buscar”, lembra Edson.

Dois anos depois, Getúlio também seguiu rumo à capital, com a mulher e três filhos, e começou uma nova sociedade com o irmão Arnaldo, agora em uma loja de peças para automóveis. “Com a loja, a vida mudou, construiu casa, comprou carro e passamos a ter a vida digna que ele tanto almejava”, relembra Edson.

Mas, foi em 10 de setembro de 1981 que a vida de Edson sofreu uma completa transformação. Aos 13 anos, sofreu um acidente na escola. Desmaiou em cima de uma árvore enquanto brincava e, por consequência da queda, ficou tetraplégico, sem movimentos do pescoço para baixo.

“Tudo mudou, literalmente, em um piscar de olhos. Em um momento eu estava em cima de uma árvore brincando e, quando abri os olhos novamente, estava caído no chão, sem sentir ou poder movimentar todo o meu corpo. Eu era uma criança normal, saudável e cheio de energia para gastar, nunca havia passado por nenhum internamento hospitalar. Isso tudo mudou, pois a energia que era apenas com brincadeiras, passou a ser gasta com o intuito de sobreviver”, recorda.

Contrariando todas as expectativas dos médicos, que indicavam apenas vinte dias de vida para o adolescente, Edson sobreviveu com o carinho e cuidados que os pais tiveram com ele, superando as adversidades das infecções e pneumonias frequentes.

Os olhares curiosos das pessoas o incomodavam, já que “estava em uma cadeira de rodas, muito magro”. O incômodo logo passou, pois em janeiro de 1985, foi para um hospital de reabilitação em Brasília (DF), onde permaneceu internado por três meses. Orientado pelos profissionais, Edson voltou para os estudos na mesma escola em que o acidente havia acontecido.

“Comecei a me reintegrar na sociedade com os passeios e viagens com a família, a fazer novos amigos”, afirma.

O jovem finalizou o ensino médio em 1990, mas precisou interromper novamente os estudos. Dois anos antes, a mãe, Odete, faleceu devido a um câncer de mama. A partir deste momento, o pai era a única pessoa que o conduzia para todos os lugares e não dispunha de tempo para o locomover e proporcionar o ensino superior.

“Continuei morando em Curitiba durante todos esses anos que se seguiram. Meus primos começaram a dirigir, saíamos para vários lugares: cinema, restaurante, balada. Conheci muitas pessoas, namorei, trabalhei como auxiliar de escritório e depois com a venda de tintas automotivas e implementos”, lembra.

Em 2009, então, Edson conheceu a mulher que se tornaria sua esposa, Erelisa. Foi por motivação dela que decidiu ingressar para um curso superior.

 

Atuação do SIANEE

Edson havia finalizado recentemente o curso de Gestão Pública, também na Uninter, no polo de apoio presencial (PAP) Catedral (Edusol), quando decidiu prestar vestibular para Direito, em 2014. Erelisa, sua esposa, é advogada e intérprete da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), e foi quem o incentivou na caminhada acadêmica.

Na graduação de Gestão Pública, realizada na modalidade à distância, contava com o apoio da professora Cecília Pestana no polo, “sempre muito parceira e compreensiva com todas as situações que envolviam proporcionar acessibilidade. Ela se sentava ao meu lado, abria a prova online e ia fazendo a marcação da opção que eu dizia ser a correta. Grato à Cecília por todo carinho e atenção”, destaca Edson.

O egresso optou pela Uninter devido à proximidade com a casa onde morava e também pelo apoio e acessibilidade que necessita e recebeu do SIANEE. Iniciou os estudos de Direito no prédio Divina Providência, mas logo o curso foi transferido para o campus Garcez, ambos na região central de Curitiba.

Edson explica que, devido ao corpo todo paralisado, não consegue empurrar a cadeira de rodas ou segurar uma caneta, por isso sempre se fez necessário o auxílio de outra pessoa. A princípio, a esposa o acompanhava todos os dias até a faculdade, mas depois que comprou uma cadeira motorizada, conseguiu se deslocar com maior independência de casa para a faculdade e vice-versa.

Dentro da instituição, o maior desafio era obter a matéria escrita para estudar, pois apesar de todos terem conhecimento da tetraplegia, poucos levavam os materiais adaptados. Para isso, Edson sempre contou com apoio dos colegas de sala.

“O SIANEE foi minha salvação nesse sentido. Foi espetacular, pois em outras instituições de ensino nunca me deparei com um setor igual. Esse setor, coordenado pela professora Leomar Marchesini, pode ser traduzido como o respeito com a pessoa com deficiência em toda a sua diversidade que falta em todas as outras instituições de ensino”, salienta Edson.

De acordo com a professora Leomar, o primeiro cuidado que a equipe do SIANEE teve foi de verificar as condições de acessibilidade física, arquitetônica e de mobiliário do Garcez e seu entorno. A coordenadora afirma que o campus é totalmente acessível, com todas as adaptações previstas na legislação brasileira. Logo de início, o aluno teve autorização para gravar todas as aulas, em razão de impossibilidade de escrever.

“Edson realizava suas provas com auxílio de um escriba, colaborador do SIANEE que aplicava as avaliações na sala de apoio do setor. Teve tempo estendido para realização de provas e prazo ampliado para entrega de trabalhos, de acordo com suas necessidades. Na sala do Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), uma mesa foi adequada para o discente, de modo a acomodar a sua cadeira de rodas, e um computador foi totalmente adaptado para utilização do aluno”, complementa Leomar.

Para a professora, entre os mais importantes suportes para um aluno com tetraplegia, primeiramente vem a atitude inclusiva de professores e colegas da instituição, significando o início do estabelecimento de uma posição mental e emocional favoráveis ao processo de ensino aprendizagem, além de todas as condições de acessibilidade física.

“Uma pessoa que se sente acolhida, aprende mais e melhor”, salienta.

 

Os obstáculos superados para a formação

Por um período de um ano e meio, Edson precisou trancar a matrícula do curso, para dar maior atenção à saúde. Desde 2015, ele atua como securitário para a Bradesco Seguros, no cargo de analista assistente de operações. Por isso, transferiu o curso para o período da noite, e participar das aulas passou a ser mais cansativo.

“O meu dia começava às 5h30 da manhã e só se encerrava às 23h. Trabalhando durante o dia e mais a faculdade no período noturno, eu já não tinha mais tempo para tomar os cuidados básicos para a saúde de uma pessoa com deficiência física motora. A fisioterapia é o principal deles. Tive que trancar o curso, procurar um fisioterapeuta que atendia em casa e realizar alguns exames que estavam pendentes”, conta.

Mesmo assim, Edson não desistiu da graduação e retornou para finalizar o curso. Dos bons momentos, um dos que mais marcaram foi a visita que os professores da Uninter programaram para o Superior Tribunal Federal (STF), em 2017. Edson foi um dos sorteados. Ele lembra da companhia dos professores Rodrigo Monteiro, Hugo Sirena e Tatiana Lauand, além dos diversos alunos da área do Direito.

Mas os anos finais também foram marcados por períodos delicados. Em julho de 2020, já na reta final, Edson foi acometido por um problema pulmonar, causado por uma infecção generalizada, que o deixou internado na unidade de terapia intensiva (UTI) por 40 dias.

“Os médicos tiveram que fazer uma traqueostomia para salvar a minha vida. Após retornar para minha casa, permaneci em internamento domiciliar, usando aparelho de respiração e traqueostomia”, lembra.

A solicitação de tratamento especial foi prontamente atendida pela coordenação do curso de Direito. Assim que voltou a ficar sentado na cadeira de rodas, Edson retomou os estudos, que finalizou em dezembro de 2021, ainda em internamento domiciliar.

 

Diferencial Uninter

Para Edson, as graduações realizadas na Uninter significaram melhores oportunidades de trabalho.

“Antes da minha primeira graduação as propostas de emprego eram de baixa remuneração e em funções que não me permitiam trabalhar, pois basicamente se resumia a trabalhos manuais. Logo após a graduação, as propostas foram muito melhores financeiramente e em serviços administrativos”, afirma.

Atualmente, o profissional retomou as atividades do trabalho na Bradesco Seguros, por enquanto em home office. E após o expediente, auxilia a esposa nos assuntos pertinentes à área de Direito, no escritório de advocacia que possuem, o Vieira Bazan Advocacia.

“Estou naquela fase que pode ser considerada como estágio. Faço serviços mais burocráticos e atuo nos assuntos relacionados ao financeiro do escritório. Atuo também na discussão dos casos e o melhor caminho a ser tomado nos processos de nossos clientes. Ainda continuo aprendendo muito, mas agora é no dia a dia da prática jurídica e colocando em prática tudo que aprendi com os professores na Uninter”, conclui.

Agora, Edson está matriculado na pós-graduação de Direito da Pessoa com Deficiência, com previsão de início para julho de 2022. O profissional almeja “prestar a prova da OAB assim que possível e atuar na área do Direito da Pessoa com Deficiência e Previdenciário”.

Ele diz que em toda a trajetória, se não fosse o apoio dos pais e dos irmãos, Celma, Ana Maria e André, assim como o da esposa, nada teria acontecido.

“Principalmente o apoio e estímulo da minha esposa, pois foi através dela que descobri a Uninter e seus cursos, foi ela que me falou sobre a existência e atuação do SIANEE, que me acompanhou durante toda essa empreitada. Não tenho palavras para agradecer tudo o que ela fez e ainda faz por mim. Sou grato a Deus por ter colocado essa mulher maravilhosa em meu caminho”.

“Gostaria de agradecer a todos os meus mestres, indistintamente, por todo o carinho e ensinamentos que me proporcionam ao longo de toda essa jornada em que permaneci na Uninter”, finaliza Edson.

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Autor: Nayara Rosolen
Edição: Larissa Drabeski


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