Como Estado Democrático de Direito, Brasil precisa de mais igualdade de gênero

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

A Constituição de 1988 apresenta o Brasil como um Estado Democrático de Direito, não só na forma de organização e governo, mas também no acesso. O documento traz, logo nos primeiros artigos, alguns princípios que devem ser seguidos, como a dignidade da pessoa, a cidadania e a valorização do trabalho. Dentro disso, cabem também os direitos humanos, um conjunto de direitos que foi construído com o desenvolvimento da sociedade, que tem como base o cidadão e a preservação da dignidade.

A igualdade entre homens e mulheres é uma das metas que se busca alcançar. Os papéis de cada um, dentro das comunidades, foram delimitados como o homem sendo aquele que provê o sustento e a mulher como a que cuida do lar e dos filhos. Logo, ela não ocupava muitos espaços fora desse ambiente e ao longo dos séculos foi conquistando direitos, como o direito ao voto nos anos 1930. No século 20, vários documentos foram sendo criados para promover maior igualdade e a Constituição brasileira dialoga com eles, assim como os que surgiram depois dela. Um deles é a Agenda 2030, que contém os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Todos os objetivos dialogam entre si, mas dois específicos visam à garantia da “Igualdade de gênero” (ODS 5) e “Trabalho decente e crescimento econômico” (ODS 8). De acordo com a mestre e doutoranda em direito político e econômico Juliana Leme Faleiros, que pesquisa sobre direito das mulheres, “pensar o desafio da igualdade entre homens e mulheres é muito interessante, porque é atual. A Constituição diz que somos todos iguais e acredita que dizendo isso vai ser vivenciado, mas sabemos que não”.

Juliana afirma que, apesar dos princípios colocados nos documentos e do objetivo de construir uma sociedade “justa, livre e solidária”, os resultados de pesquisas demonstram a dificuldade de tirar isso do papel e colocar na prática. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), as mulheres passam uma média de 8 anos estudando, já os homens cerca de 7 anos e meio. Ainda assim, conforme divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2020, os homens recebem em média 30% a mais.

Na área da magistratura, de acordo com Conselho Nacional da Justiça, as mulheres compõem 50,5% da Justiça do Trabalho; na Justiça Estadual, 37,4%; nos Tribunais Superiores, 19,6%; e na Justiça Militar Estadual, 3,7%. Com isso, Juliana pontua que as mulheres entram sim para a carreira, mas encontram obstáculos para ascensão, principalmente em cargos que recebem por nomeação, como os Tribunais Superiores. “Existe uma segregação vertical, existe um teto de vidro para as mulheres em algumas carreiras”, completa a pesquisadora.

Outro ponto importante é pensar sobre a socialização do cuidado. Segundo pesquisa divulgada pelo IBGE em 2020, pessoas com 14 anos ou mais gastam a média de 16 horas por semana em atividades domésticas. O mesmo estudo diz que mulheres despendem cerca de 21 horas e homens 11 horas. Ou seja, as mulheres dispõem de um tempo muito menor para a participação não só no mercado de trabalho, mas também em atividades básicas como cidadãs.

“Como as mulheres vão participar dos problemas dos seus bairros, vão estudar, vão para o mercado de trabalho, se elas têm uma carga maior? Com qual qualidade elas vão se envolver nas questões da sociedade, com qual intensidade, se elas têm todas essas horas na semana para se dedicar a atividade doméstica? O objetivo 5 está pedindo para enfrentar esse desafio da desigualdade, um deles é reconhecer e valorizar esse trabalho que não é remunerado. Ele vai dizer para a gente pensar que o Estado Democrático de Direito deve disponibilizar serviços públicos, infraestrutura e políticas de proteção social. A creche, por exemplo. A ampliação de creches para atender mulheres mães atende essa demanda”, explica Juliana.

A profissional lembra que homens e mulheres são socializados de formas diferentes e, por isso, sofrem impactos diferentes. As próprias cidadãs vivem realidades diferentes e apresentam diferentes demandas, para isso são necessárias as pesquisas. Já que a lei se diz abstrata, “serve para todo mundo”. Juliana afirma ainda que não compactua com a ideia de que a desigualdade é uma questão cultural, que “desde sempre foi assim e ponto”.

“Se é cultural, mais uma chance de a gente mudar. O cultural não significa que é para sempre”, conclui. Juliana indica dois documentários para aqueles que querem saber mais sobre o assunto: “O silêncio dos homens”, que pode ser encontrado no Youtube, e “The mask you live”, disponível na Netflix. A pesquisadora discutiu o tema “Mulher, trabalho e desafios da desigualdade” no segundo dia das aulas magnas da Escola Superior de Educação (ESE) da Uninter.

O evento foi transmitido ao vivo nas redes sociais da ESE, no dia 18.fev.2021, e contou com os professores Renata Garbossa, Maria Tereza Xavier, Gisele Cordeiro, Cícero Bezerra e Paulo Martinelli na abertura. A live continua disponível para acesso neste link.

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Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Ekaterina Bolovtsova/Pexels


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