Astrônomos amadores: a ciência é mesmo só para o cientista?
Autor: Daniel Tedesco, Dinamara Pereira Machado e Flavia Sucheck Mateus da Rocha*Em épocas de fake news e negacionismo, pode parecer um absurdo incentivar práticas de descobertas científicas que não se pautam em método e revisão por pares. O recém-lançado filme da Netflix “Não olhe para cima” aborda a importância da ciência para a continuidade da espécie humana e mostra que a ignorância e o ceticismo trazem consequências catastróficas.
Contudo, a educação, que obviamente valoriza a ciência e o método científico, precisa tomar um cuidado quanto ao seu endeusamento e exclusivismo. Enquanto a ciência for vista como imutável, infalível e disponível apenas para uma parcela seleta da população, estudantes da educação básica e do ensino superior continuarão a observá-la apenas de longe.
Uma nova visão para a ciência, em movimento e falível, não significa desvalorizá-la, apenas abre portas para novas possibilidades, com incentivo à realidade de cada indivíduo, à cultura e ao respeito aos saberes populares. Nessa perspectiva, cientistas mirins, entusiastas e amadores podem ser ouvidos.
Recentemente, um estudante do curso superior de Física da Uninter (onde somos professores), nos enviou uma foto do telescópio espacial James Webb, lançado no dia 24 de dezembro de 2021. O telescópio foi desenvolvido em conjunto pela NASA e as agências espaciais europeia e canadense para substituir o telescópio espacial Hubble, lançado em 1990, que foi utilizado em diversos problemas da Astronomia, como a medição da taxa de expansão do universo.
A imagem enviada pelo nosso estudante mostra o telescópio espacial James Webb indo a caminho do ponto lagrangiano L2, que é uma posição no espaço onde a força gravitacional entre um planeta e outro objeto (no caso o sistema Terra-Sol) é equilibrada com a força centrífuga. Na prática, isso significa que a sonda está viajando dentro ou perto da zona tridimensional que existe no espaço, com um consumo de combustível mínimo. Nessa região L2, habitam também outros satélites importantes como o WMAP e Planck.
De fato, o céu é para todos, e a astronomia amadora vem para mostrar este fato. Com a popularização desta prática com Carl Sagan, um grande cientista e divulgador de ciências, a astronomia chegou ao lar de diversas pessoas, despertando o interesse pela observação do céu. Os apaixonados pela astronomia investem tempo e dinheiro, adquirindo equipamentos, softwares e se dedicando à observação do céu, para responder as suas curiosidades científicas de forma prática.
Nesse contexto, a palavra “amador” significa apenas que o indivíduo adquiriu seu conhecimento em ambientes não formais ou acadêmicos, mas a astronomia amadora contribui em muito com o trabalho dos profissionais e cientistas acadêmicos.
A universidade tem um papel crucial no despertar dessas curiosidades, evidenciando que cada estudante pode realizar descobertas. Quando um acadêmico compartilha uma prática investigativa pessoal, os professores podem escolher invalidar a prática do aluno, alegando que a experiência não foi realizada em laboratório e a partir de método científico e, por isso, perdeu o valor.
Outra opção é lapidar, encorajar e valorizar, considerando que ser um cientista amador não repercute em amadorismo na ciência. A prática realizada não formalmente pode ser melhorada a partir da intervenção acadêmica e recursos físicos, digitais e cognitivos que a instituição possui.
A ciência é da criança, do adolescente, do estudante universitário, do ser humano!
* Daniel Guimarães Tedesco, doutor em Física, docente na área de Exatas da Escola Superior de Educação da Uninter; Dinamara Pereira Machado, doutora em Educação, diretora da Escola Superior de Educação da Uninter; Flavia Sucheck Mateus da Rocha, mestre em Educação em Ciências e em Matemática, coordenadora da área de Exatas da Escola Superior de Educação da Uninter.
* Imagem: Foguete Ariane 5 é lançado com o telescópio espacial James Webb, desde a rampa de lançamento do Centro Espacial da Guiana, Kourou, Guiana Francesa, 25 de dezembro de 2021.
Autor: Daniel Tedesco, Dinamara Pereira Machado e Flavia Sucheck Mateus da Rocha*Créditos do Fotógrafo: Agência Espacial Brasileira