A regularização de produtos à base de Cannabis na medicina veterinária
Autor: *Darleny E. G. HorwatMédicos veterinários habilitados pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) já podem prescrever medicamentos à base de Cannabis registrados pela Anvisa, produtos de Cannabis com autorização sanitária emitida pela Anvisa e produtos de uso exclusivo animal que venham a ser regularizados pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). A diretoria Colegiada da Anvisa aprovou, no dia 30 de outubro, uma medida que possibilita a regularização de produtos à base de Cannabis sativa pelo Mapa e a prescrição desses produtos por médicos veterinários.
Essa decisão representa um avanço para a saúde animal, pois as propriedades terapêuticas da Cannabis são descritas há séculos. Porém, devido a todo histórico de uso recreativo e abuso, a legislação de diversos países tornou-se rígida quanto ao seu cultivo e manipulação, o que limitou o uso medicinal e o avanço das pesquisas. Entretanto, nos últimos anos, esse cenário tem mudado e o uso medicinal da Cannabis sativa vem crescendo.
No Brasil, os primeiros passos foram dados em 2014, com a primeira decisão judicial autorizando a importação de um remédio feito à base de Cannabis, e em 2015, quando a ANVISA regulamentou a importação de medicamentos derivados da planta. Outro avanço importante foi em 2019, quando a ANVISA regulamentou a venda de produtos à base de Cannabis em farmácias comerciais.
Em humanos, a planta tem sido usada no tratamento de epilepsia, dores crônicas, náusea, vômito, anorexia, glaucoma, esclerose múltipla e insônia. Na medicina veterinária, poderá ser utilizada em tratamentos para dor, processos inflamatórios, distúrbios cognitivos, alterações comportamentais (como ansiedade), dermatite atópica e epilepsia. Em casos de epilepsia, há relatos de pacientes que, utilizando tratamentos tradicionais, não apresentaram o resultado desejado no controle das crises e/ou sofreram significativamente com os efeitos colaterais, assim, o tratamento com Cannabis poderia ser uma alternativa. Também existem relatos do seu uso durante o tratamento do câncer, ajudando na redução de náuseas, inapetência e vômitos. Em muitas doenças, como na disfunção cognitiva canina, não se espera a cura do animal, mas o objetivo está em proporcionar mais conforte e melhora na qualidade de vida.
Antes dessa decisão da Anvisa, profissionais já vinham receitando o produto, valendo-se de uma brecha jurídica e de liminares na Justiça. Quando um especialista queria que uma fórmula fosse manipulada, se prescrevia o óleo indicado para o animal e fazia um termo de esclarecimento para o tutor. Ambos eram entregues pelos tutores dos animais às associações que comercializavam os óleos. Esse cenário trazia grande insegurança, como a Anvisa só permitia que profissionais com inscrição no Conselho Regional de Medicina fizessem a prescrição, médicos veterinários estavam em desobediência civil e sujeitos a responder criminalmente.
Mesmo após a regularização, sabe-se que para trabalhar com a prescrição de produtos à base de Cannabis é necessário que os profissionais tenham conhecimento sólido e aprofundado, uma vez que as dosagens e aplicações requerem cuidado específico e ajustado a cada caso. Outro ponto importante a se ter em mente é que, assim como outros produtos, a Cannabis sativa não pode ser encarada como uma cura milagrosa. Muitos trabalhos vêm demonstrando os benefícios e eficiência da Cannabis medicinal no tratamento de diversas doenças, mas ainda são necessários mais estudos científicos em animais. Além disso, os tutores precisam saber que em muitos casos, o tratamento convencional ainda será necessário, e ambos atuarão em conjunto para a melhora do animal.
O reconhecimento da Cannabis como uma ferramenta terapêutica, tanto na medicina quanto na medicina veterinária, é muito relevante. A sua regulamentação na medicina veterinária possibilita o desenvolvimento de mais pesquisas e estudos clínicos. Também possibilita que os tratamentos cheguem aos tutores com preços mais acessíveis.
*Darleny E. G. Horwat é médica veterinária, doutora em Ciências Veterinárias e professora do curso de medicina veterinária do Centro Universitário Internacional Uninter.
Autor: *Darleny E. G. HorwatCréditos do Fotógrafo: Pexels e Arquivo Pessoal