O amor pelo esporte fez de Evelyn uma vencedora

Autor: Nayara Rosolen - Jornalista

Disputar um campeonato nacional é o sonho de todo atleta. Evelyn Cristine Barbian, 25 anos, não só competiu como garantiu o vice-campeonato brasileiro pela seleção gaúcha de basquetebol, em 2011. A jovem contabiliza 55 medalhas, dois troféus e uma trajetória com passagem por cinco equipes gaúchas, em diversas competições.

Agora, Evelyn soma o amor antigo pelo esporte com a paixão pelo aprendizado e transmissão dos conhecimentos, dentro e fora das quadras. Egressa do curso de Educação Física da Uninter, no polo de Santa Cruz do Sul (RS), atuou como monitora do curso e foi treinadora do time de basquete em cadeira de rodas da Associação Santacruzense de Pessoas Portadoras de Deficiência Física (Aspede). Hoje, é professora em uma academia de CrossFit em Vera Cruz (RS).

“No início, o meu sonho era ser uma jogadora profissional, porém por medo ou até por imaturidade, não tive coragem de ir em busca disso. Mas a paixão e a vontade de aprender ainda mais sobre o mundo da educação física, me fizeram optar por seguir essa profissão. Não me vejo em nenhum outro local que não seja no meio das pessoas, ensinando e aprendendo com elas”, afirma Evelyn.

A coordenadora do polo, Mônica Eliza Malacarne, conta que a egressa também participou da comissão organizadora da 5ª Semana Acadêmica Integrada, demonstrando interesse e empenho nas atividades, sempre contribuindo de maneira efetiva no processo de construção das atividades e programações.

“Recentemente, quando apresentou o trabalho de conclusão de curso (TCC), observamos sua paixão pelo tema. É inegável que será uma grande educadora física”, garante Mônica.

Evelyn apresentou a pesquisa “Basquetebol em cadeira de rodas – esporte como ferramenta de inserção social de atletas” no dia 24 de março de 2022, na qual conquistou nota máxima.

Basquete, uma paixão antiga

As primeiras partidas de basquete, Evelyn acompanhou ainda antes de nascer. Natural de Santa Cruz, onde o basquete era muito valorizado, seus pais, Alberto e Denise, sempre foram amantes do esporte e não perdiam as competições. Na época, a cidade contava com o time da Piit Corinthians, que disputava o campeonato brasileiro de basquetebol. Denise conta que ia aos jogos grávida de Evelyn e tem certeza de que esse amor pelo esporte foi passado assim, ainda na barriga.

“De fato, hoje quando eu vejo as fotos, os vídeos daquela época, sinto uma emoção muito grande, pois era surreal a quantidade de pessoas que iam aos jogos e vibravam com o Corinthians”, diz a jovem.

Evelyn viveu uma infância tranquila, sempre rodeada pela família. Iniciou os estudos no Colégio Estadual de Santa Cruz e aos oito anos começou a escutar as colegas conversando sobre o time de basquete da escola. Apesar de não entender muito sobre o esporte, o que chamou a atenção foram as viagens que as jogadoras faziam para outras cidades. Isso “encheu os olhos” da gaúcha, que achou “o máximo” fazer parte de um time de basquete para viajar.

Na época, no entanto, Evelyn fazia balé. Um pouco contra a própria vontade e mais porque a mãe achava bonito. Denise ficou assustada com o pedido de troca para o basquete, mas logo apoiou e começou a levar a filha para os treinos.

“Estar em quadra para mim era sinônimo de libertação, pois eu era muito tímida, mas quando entrava em quadra, ficava irreconhecível. Me tornava uma menina forte, que podia mostrar o seu talento e que era capaz. Esse esporte me transformou e me fez ser uma mulher muito mais forte hoje”, salienta.

Com o passar dos anos e as participações em campeonatos, Evelyn recebeu uma proposta de bolsa para uma escola particular da cidade, desde que fizesse parte do time de basquete da instituição. Uma questão a fazia querer recusar: a equipe era a maior rival do time em que a jogadora estava na época. Mesmo contra a vontade, a decisão final era dos pais e a jovem acabou sendo transferida.

Além da oportunidade de um estudo melhor, os pais também pensaram que a jogadora poderia participar de campeonatos maiores e com maior visibilidade, o que se confirmou com a convocação para a Seleção Gaúcha de Basquete. Evelyn participou da equipe de 2011 a 2013 e foi vice-campeã brasileira de basquetebol no primeiro ano de atuação.

Evelyn também disputou outros campeonatos, como o Encontro Sul-americano de Basquete, os Jogos Escolares do Rio Grande do Sul (JERGS), campeonato estadual, basquete de areia, basquete de trios, entre outros. Passou também por outras quatro equipes: Colégio Ernesto Alves e Colégio Mauá, ambos de Santa Cruz, Colégio Concórdia, de Canoas (RS), Colégio Farroupilha, da capital Porto Alegre (RS). As diversas oportunidades caminharam junto com um bom aprendizado.

“Me sinto uma pessoa de sorte. Em cada local, tive experiências únicas e que me transformaram como pessoa. Talvez meu único arrependimento tenha sido não ter a coragem e maturidade suficiente para seguir como jogadora nesse esporte. Mas eu acredito que o meu propósito maior seja passar todo esse conhecimento a outras pessoas e fazer a diferença na vida delas”, afirma.

De jogadora à treinadora

Durante a formação em Educação Física, Evelyn conheceu a Aspede e se “encantou” pelo time que joga basquetebol em cadeira de rodas. Decidiu se aproximar para entender melhor a modalidade e soube que o treinador estava de saída, por isso estavam à procura de outra pessoa para dar continuidade.

Apesar do receio de não dar conta ou de não ser uma boa treinadora, a jovem prontamente aceitou o convite e o desafio. O time todo a recebeu super bem e acreditaram no trabalho e em todo o conhecimento que podia transmitir para eles.

“Recordo-me que em um dos primeiros treinos, fui pegar as tabelas móveis para posicionar e dois dos atletas vieram atrás de mim e me disseram que eles arrumavam sozinhos toda a quadra e os materiais. Na verdade, eu achei que eles não conseguiam fazer isso e estava muito enganada, pois conseguem fazer qualquer coisa. Daquele dia em diante, comecei a olhar eles com outros olhos e eu sentia muito orgulho de cada um ali, pois eles eram sinônimo de superação e força de vontade”, conta.

Outro impacto foi a descoberta de que 99% dos jogadores ficaram em cadeira de rodas ou utilizavam prótese por causa de acidentes de moto. Pessoas que “tiveram uma segunda chance de viver e se reencontrar”. “Ver a equipe jogando, treinando e com um sorriso lindo no rosto, não tinha preço que pagasse”, lembra.

“Aprendi muito como treinadora, pois tive que inverter o papel. Sempre estava no lado de dentro da quadra, jogando, e dessa vez fui para o lado de fora, orientando. Essa troca foi maravilhosa, afinal eu pude valorizar o quanto é importante e a responsabilidade que se tem ao orientar um time. É um jogo de equipe, onde todos temos que nos unir e dar o melhor, independente da função”, destaca.

Evelyn foi voluntária como treinadora por quase um ano e realizou o estágio obrigatório da faculdade com o time também. A equipe foi campeã da 4ª Copa Campo Bom de Basquete em Cadeira de Rodas, em Erechim (RS), no ano de 2018.

“Primeira vez como técnica e primeira vez nessa modalidade, foi uma felicidade maior do que quando eu jogava”, afirma a ex-jogadora.

Os segundos que mudaram a vida de Evelyn

Se Evelyn se sentia inspirada ao ver o desempenho e a dedicação de atletas que tiveram suas vidas mudadas de uma hora para outra, ela mesma precisou resgatar forças para acreditar que também teria uma segunda chance.

No início de 2020, Evelyn atuava como monitora no polo da Uninter em Santa Cruz. Os pais sempre a buscavam à noite no polo. Na saída do dia 20 de janeiro, um carro furou o sinal vermelho em um cruzamento e bateu em cheio no veículo em que a família estava. O automóvel atingiu o lado da jovem e a batida foi tão forte, que as únicas lembranças do momento são contadas pelos pais.

“Foi questão de segundos que mudaram a minha vida. Minha última lembrança é estar saindo da Uninter, e depois acordei na sala de emergência do hospital, com muita dor. Bem no momento que estavam fazendo pontos no meu rosto, pois os vidros do carro estouraram e os cacos me atingiram”, conta.

A jovem teve o osso sacro do lado esquerdo e o cóccix fraturados. Teve que ficar de repouso absoluto para que o osso pudesse colar novamente. “Daquele dia em diante, passei por muitos momentos ruins”, recorda. Evelyn diz que “um filme passou pela cabeça”, pensando em vários momentos sobre como os alunos da Aspede se sentiam após terem se acidentado.

“No meu caso tive sorte, Deus me deu uma segunda chance e pude caminhar de novo. Mas como fiquei oito meses sem caminhar, não podia fazer nada sozinha nesse período. Senti na pele o que é ficar impossibilitada de uma hora para outra. Aprendi a valorizar cada coisa que eu conseguia fazer depois disso”, afirma.

Para quem estava acostumada e é amante de esporte, foi um período desafiador ser obrigada a se manter apenas deitada ou sentada. Além disso, precisou passar por quatro médicos, com opiniões divergentes. Diziam que ela precisava operar ou que teria que mudar de profissão, pois nunca mais poderia ter impactos sobre a coluna.

“Ouvi muita coisa e, por vários momentos, achei que teria que desistir de ser educadora física. Lembro até hoje de quando comprei uma bicicleta ergonométrica para utilizar em casa. Parecia uma criança quando ganha um brinquedo. Para mim, foi um recomeço”, comemora.

Aos poucos, em uma recuperação lenta, Evelyn passou da bicicleta para a esteira, começou a caminhar na rua e voltou a fazer atividades físicas.

“Quem diria que eu poderia ser professora de CrossFit né? Superação e força de vontade são palavras que eu carrego comigo”, garante.

A importância do basquete em cadeira de rodas

A experiência com o time do Aspede ajudou Evelyn a decidir sobre a produção do trabalho de conclusão de curso (TCC). Ela explica que “falar de algo que nos traz felicidade e que a gente ama, fica muito mais fácil e prazeroso”.

Na pesquisa “Basquetebol em cadeira de rodas – esporte como ferramenta de inserção social de atletas”, quis dar ênfase à forma como o esporte insere os atletas de volta à sociedade. A egressa ressalta que a família de cada um é essencial para que tenham uma base mais forte e se sintam capazes de jogar.

“Eu vi pai, mãe, irmão e até filhos nos treinos, incentivando, gritando, chorando e torcendo pelo seu familiar. O esporte é uma ferramenta muito transformadora, e no caso do basquete sobre rodas, eu arrisco dizer que pode trazer vida de novo aos atletas. Eles se sentem pessoas normais quando estão em quadra, e afinal é isso que são, porém falta a gente, enquanto sociedade, quebrar esse pré-conceito”, salienta.

Ao longo do trabalho, Evelyn apresenta vários fatores que melhoram a vida dos jogadores por meio do esporte, como a parte física e mental, e “como isso pode transformar alguém que antes se sentia inútil, e hoje se descobriu novamente para a vida”.

Experiência Uninter

Evelyn iniciou a graduação ainda em 2014, mas desmotivada pelo curso realizado em outra faculdade da cidade, nos anos seguintes foi à procura de uma nova instituição. Foi assim que, em 2018, conheceu a Uninter e soube que o curso de Educação Física estava disponível há poucos meses.

“Eu vejo a Uninter como um divisor de águas na minha vida acadêmica, pois tenho certeza de que aprendi muito durante todo o curso, e o suporte que eu tive do polo e da orientadora foram muito especiais. O curso me ajudou muito a me expressar melhor e a enxergar a educação física com outros olhos. Hoje eu vejo que nós temos um papel muito importante na sociedade, e que somos agentes transformadores e cuidadores da saúde das pessoas”, explica.

Em 2011, Evelyn havia se mudado para Vera Cruz, então partia da cidade vizinha para as atividades realizadas no polo de Santa Cruz sempre que necessário. Desde os 17 anos também trabalhava como jovem aprendiz na Mercur para custear as mensalidades da graduação, mesma empresa em que o pai trabalha.

“Durante todo o período da faculdade, trabalhei o dia inteiro e à noite estudava. Para quem também faz isso, sabe que não é fácil, mas é preciso para que possamos garantir nosso estudo. Após a minha entrada na Uninter, esse fato aliviou, pois os nossos encontros eram mais espaçados e isso me devolveu um pouco da vida social”, conta.

Contava com o apoio dos pais e da avó, Erica, que morava perto da instituição e conseguia auxiliar nos intervalos entre as atividades de Evelyn. A então estudante também colaborou como monitora de Educação Física da unidade, “uma experiência maravilhosa e de muitos aprendizados”.

“A Rochele, que é orientadora do curso no polo de Santa Cruz, foi um ser de luz que entrou na minha vida. É uma profissional única e como pessoa é muito boa, sempre está disposta a ajudar”, afirma.

A trajetória de Evelyn na instituição foi tão positiva, que ela já se prepara para iniciar a pós-graduação em Treinamento Esportivo no próximo dia 23 de maio. Atualmente também faz um curso de árbitra de basquete e sonha poder continuar o trabalho no esporte.

“É isso que eu mais amo e me dá prazer. Ainda vou conseguir ser treinadora e passar todo o meu conhecimento de jogadora e tudo o que eu aprendi na faculdade. Sei que não vai ser muito fácil, pois hoje a maioria dos treinadores são homens, porém eu vou em busca desse sonho e sei que um dia, e na hora certa, vou conseguir. Infelizmente o sonho de ser jogadora hoje já não é mais possível, mas eu sei que, como treinadora, também terei muito a contribuir. Trabalhar com pessoas me encanta”, complementa.

A solenidade de colação de grau, realizada pelo polo de Santa Cruz acontece no dia 26 de novembro. Para Evelyn, “é a concretização de um sonho”.

“Estou muito feliz, pois sempre sonhei em estar formada na faculdade e fazer a minha formatura. Me deixa mais feliz o fato de os meus pais estarem orgulhosos de mim e acreditarem nos meus sonhos”, finaliza.

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Autor: Nayara Rosolen - Jornalista
Edição: Larissa Drabeski


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