Alfabetização e trabalho: um direito negligenciado na realidade jurídica

Autor: (*) Priscilla Bortolotto Ribeiro

No dia 8 de setembro foi comemorado  o Dia Mundial da Alfabetização, declarado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) em 26 de outubro de 1966. A data é significativa, pois nos faz lembrar da importância da alfabetização como um direito fundamental, reconhecido internacionalmente, e essencial para o exercício pleno de outros direitos humanos. A alfabetização não apenas capacita indivíduos a ler, escrever e compreender informações, mas também promove a habilidade de participar ativamente na sociedade. 

E qual é a relação da alfabetização com as leis trabalhistas? Antes da existência da Lei 13.874/2019, conhecida como Lei da Liberdade Econômica, menores de 18 anos apenas poderiam trabalhar se comprovassem ser alfabetizados – por meio do certificado de conclusão do primário ou documento equivalente. Porém, a referida lei revogou o artigo 419 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Deste modo, pela legislação vigente, o menor de 18 anos pode ser contratado para trabalhar, mesmo que não seja alfabetizado. 

A única referência ao trabalhador menor e analfabeto presente na CLT está no parágrafo único do artigo 427, que estabelece que empresas localizadas em áreas onde a escola mais próxima esteja a mais de 2 (dois) quilômetros de distância, e que tenham mais de 30 (trinta) menores analfabetos, com idades entre 14 (quatorze) e 18 (dezoito) anos, são obrigadas a providenciar um local para ofertarem instrução primária. 

A pergunta que deve ser feita aqui é: a permissão para que menores de idade possam trabalhar sem ao menos saber ler e escrever veio para colaborar com a sociedade? Alguns poderão responder que sim, pois tem muitos jovens que necessitam trabalhar para a manutenção de sua vida e de sua família; outros entenderão que estamos diante de um ciclo em que as atividades desenvolvidas pelo menor analfabeto não o estimula a sair dessa condição e a remuneração tende ainda ser insuficiente para a sobrevivência própria e da família, fazendo dele um eterno dependente de programas de auxílios sociais e sem perspectiva de mudança, fato este que contribui cada vez mais para a desigualdade social do país. 

O fato é que não podemos esquecer que o Brasil firmou o compromisso junto aos países integrantes da Organização das Nações Unidas, no qual se comprometeu a adotar a chamada Agenda Pós-2015. Deverá trabalhar para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre esses objetivos, temos o nº 4, que é garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos, e o n º 8, que é promover o crescimento econômico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos. 

A alfabetização é uma ferramenta poderosa para combater a pobreza, promover a igualdade social e, consequentemente, fortalecer a economia do país. Ao investir na alfabetização, estamos não apenas fortalecendo indivíduos, mas construindo uma sociedade mais justa, equitativa e inclusiva, e, certamente, a nossa legislação na esfera trabalhista, pelo menos neste sentido, não está sendo uma facilitadora para o país inclusivo, justo e melhor que desejamos. 

(*) Priscilla Bortolotto Ribeiro é especialista em Direito Trabalhista, professora e tutora dos cursos de pós-graduação do curso de Direito do Centro Universitário Internacional Uninter.

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Autor: (*) Priscilla Bortolotto Ribeiro
Créditos do Fotógrafo: Agência Brasília


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