Pesquisadora ressalta diferenças entre raça e etnia sob viés da sociologia
Autor: Waliston Alves - Estagiário de JornalismoOs sentidos das palavras “raça” e “etnia” precisam ser compreendidos da forma como se transformam historicamente. As transições entre diferentes eras da sociedade são momentos cruciais para a compreensão desses termos, contextualizados em processos de diferentes exercícios de poder e dominação entre povos.
Para a pesquisadora das relações étnico-raciais e de gênero e mestre em Sociologia Andressa Ignácio, há de se partir do pressuposto das diferenças conceituais entre as expressões. Para contemplar tal objetivo, ela baseia-se nas obras de Kabengele Munanga, professor congolês erradicado no Brasil com vasto histórico de pesquisas nas áreas de antropologia da África e da população afro-brasileira, com enfoque em temas como o racismo, políticas e discursos antirracistas, negritude, identidade negra e educação das relações étnico-raciais.
A exemplo da virada para o século 15, em estratégias expansionistas de consolidação e reconfiguração do território europeu, as diferentes denominações envoltas dos termos não se expressavam somente por vieses sociológicos. “Além de conceitos teóricos e acadêmicos, também são termos que estão envolvidos em disputas ideológicas e políticas; estes, no sentido amplo das relações de poder e de autoridade na sociedade”, comenta a pesquisadora, que também é doutoranda em Tecnologia e Sociedade pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
“É sempre importante considerar que a Europa, como os outros continentes, eram diversos entre si. Com o contexto das Grandes Navegações, esses povos europeus vão passar a ter contato com diferentes povos com os quais eles têm características bastante distintas: características culturais, características fenotípicas – como por exemplo o tom da pele, o formato do nariz, da boca, a textura do cabelo. Então esse contato, com esses povos diferentes, vai gerar uma tensão por explicar as origens dessas diferenças”, argumenta Andressa.
Tal contexto, de acordo com a professora, é profundamente marcado pelo domínio e hegemonia de uma narrativa religiosa. “O discurso religioso é uma fonte explicativa muito significativa para a realidade”, aponta. Ela complementa que uma das explicações de cunho religioso para as diferentes tonalidades de pele e características físicas existentes, segundo Munanga, baseavam-se em narrativas bíblicas. Uma delas se fundamentava no simbolismo da “origem dos Reis Magos que estavam presentes no processo de nascimento de Jesus e é uma das explicações religiosas como, por exemplo, pessoas de pele negra, pele branca e os asiáticos que eram chamados de amarelos”, pontua.
A docente enfatiza que Munanga evidencia um salto importante na construção do conceito de raça, baseado no Iluminismo, buscando interpretar e explicar os fenômenos de forma racional e científica.
Sobre a abordagem do termo “etnia”, a pesquisadora diz que, do ponto de vista das Ciências Sociais, ele é considerado como “um conjunto de indivíduos que compartilham de certas características: uma língua, religião e certos hábitos” e, que, por não considerar as pessoas negras do contexto brasileiro como um grupo homogêneo, que não compartilha de características culturais uniformes, ela acredita que o uso do termo “relações raciais” é o mais adequado.
“Eu, enquanto intelectual, não utilizo o termo ‘raça’ ou ‘etnia’ como sinônimos, e não considero que usar o termo ‘etnia’ seria correto para se referir, por exemplo, aos afrodescendentes e pessoas negras no Brasil”, pondera.
Andressa indica que, ao referir-se às relações raciais ou étnico-raciais, não tratamos apenas de um grupo isolado de pessoas. “Nós não estamos somente falando de pessoas negras. Isso inclui os indivíduos brancos, como também os povos indígenas”, ressalta.
A coordenadora dos cursos de pós-graduação em Serviço Social, Talita Cabral, sinaliza que a Uninter lançou recentemente o curso de especialização Relações de Gênero, Raça e Etnia, com o intuito de trabalhar de forma mais específica e aprofundada tais questões pertinentes à sociedade, considerando que, na maioria das vezes, são explanadas apenas em torno do senso comum.
Complementando sobre a importância da abordagem da temática de relações raciais nas instituições de ensino superior, a professora Relly Amaral, tutora dos cursos de pós–graduação em Serviço Social, salienta que é algo que necessita ser mais abordado nos cursos superiores. “Dentro dos últimos currículos, existe um direcionamento para se falar de história indígena e história africana no Brasil, só que, na minha época, não tinha. Então é algo que traz essa deficiência”, avalia.
Andressa concluiu sua fala agradecendo à Uninter pelo espaço concedido e reforçando o compromisso de todos no combate ao racismo. “Eu agradeço imensamente mais uma vez pelo convite da Uninter por poder estar nesse espaço como ativista, defensora, pesquisadora, como alguém que está engajada na luta pelo combate ao racismo. Costumo sempre dizer que a construção do racismo é algo que nós não somos diretamente responsáveis, mas é nossa responsabilidade lidar com os efeitos da constituição do racismo”, finaliza.
O programa Fala, Prof, da Rádio Uninter, recebeu Andressa em 19 de abril para conceituar as diferenças entre raça e etnia. A edição contou com mediação das professoras Talita Cabral e Relly Amaral. Para conferir a live na íntegra, basta acessar este link.
Autor: Waliston Alves - Estagiário de JornalismoEdição: Arthur Salles - Assistente de Comunicação Acadêmica