O poder das palavras positivas
Autor: Poliana Almeida – Estagiária de JornalismoDe acordo com o dicionário, expectativa é a atitude de esperar por algo ou por alguém. Em linhas gerais, podemos entender expectativa como sendo a projeção (boa ou má) de uma pessoa, situação ou local, ou seja, é a criação de um pré-conceito sobre algo. E como as expectativas interferem no desenvolvimento das equipes e de gestores dentro de uma organização?
Para refletir sobre o tema, precisamos entender o chamado Efeito Rosenthal ou Efeito Pigmaleão. Nesse sentido, alguns pesquisadores provaram que quanto maior for sua expectativa sobre uma determinada situação, maiores são as chances de ela se realizar.
Mas antes de entrarmos na definição dos cientistas propriamente dita, precisamos voltar à Grécia antiga. Um dos principais mitos da época acontece na ilha de Chipre, na qual seu rei, Pigmaleão, dedicava-se à atividade de escultor. Incrédulo com o comportamento das mulheres, o monarca estava decidido a viver em celibato. Essa atitude rendeu-lhe horas e horas empenhado em esculpir sua maior obra: a belíssima Galatéia.
Depois de finalizada, o criador apaixonou-se pela escultura, tanto que a chamava de “esposa adorada”. Logo que teve a oportunidade de fazer um pedido a Afrodite, deusa da beleza e do amor, o homem solicitou à divindade que trouxesse uma mulher idêntica à sua criação. Como não foi possível encontrar tamanha perfeição, Afrodite decidiu dar vida à Galatéia. Juntos, o casal teve duas filhas: Metarme e Pafos.
Essa pequena história é utilizada tanto na psicologia quanto na filosofia para representar o poder que as expectativas podem exercer sobre as ações de outras pessoas. Mas será que ela pode ser testada cientificamente?
Em 1968, os pesquisadores da Universidade de Harvard Robert Rosenthal e Lenore Jacobson comprovaram a história antiga por meio de um estudo prático. Eles realizaram um teste de QI para alunos de uma escola primária da Califórnia logo no início do ano letivo. Após a aplicação do exame, reuniram os professores e comunicaram que 20% das crianças conseguiram grandes pontuações e que esses discentes iriam crescer academicamente naquele ano. Vale ressaltar que os nomes das crianças foram informados apenas aos professores.
O resultado ao término do ano letivo? Os 20% selecionados realmente tiveram uma performance significativa. Entretanto, Rosenthal e Jacobson mentiram aos professores quanto ao teste, e os alunos apontados como promissores, na verdade, não tinham obtido um desempenho melhor do que os outros. Os nomes, inclusive, foram escolhidos de forma aleatória.
No fim, os pesquisadores concluíram que, ao elevarem suas expectativas sobre aqueles alunos, os professores mudaram sua atitude em relação a eles. Passaram a torná-los mais encorajados, receptivos e envolvidos com seu aprendizado. Isso, por sua vez, criou um ambiente de cumplicidade e confiança, que influenciou positivamente no desempenho final.
Também na década de 1960, o economista Douglas McGregor chegou à mesma conclusão em um estudo aplicado dentro do mundo corporativo. McGregor mostrou que a expectativa dos gerentes sobre seus subordinados afetava diretamente o desempenho. Ou seja, quando o gerente esperava coisas positivas do seu liderado, essas tendiam a acontecer. Do mesmo modo, quando as expectativas eram negativas, elas provavelmente também seriam confirmadas.
Essa premissa das expectativas é tão forte no mundo contemporâneo que também ficou conhecida como Profecia Autorrealizável e até ganhou uma série na Netflix.
Por que precisamos da validação do outro?
Toda essa discussão nos faz refletir sobre o porquê de nos sentirmos mais confiantes quando temos expectativas positivas depositadas em nós mesmos. De acordo com a professora do curso de Psicanálise da Uninter, Giseli Cipriano Rodacoski, isso acontece por sermos seres sociais. Em outras palavras, o ser humano em sua essência é interdependente socialmente, ou seja, “tanto afetamos, quanto somos afetados uns pelos outros nos diversos contextos da vida”.
Além disso, a docente explica que a necessidade de validação é para que sejam construídas as referências que serão consideradas válidas naquele contexto, naquelas relações.
Se pegarmos o exemplo de uma criança, ela é totalmente dependente dos pais quando muito nova. Os adultos serão os responsáveis por apresentá-la ao mundo externo, ou seja, dizer a ela quais são as normas, os costumes e a linguagem utilizada na região onde vive. E na medida em que se desenvolve, ela vai integrando os elementos do seu mundo até que tenha uma identidade. Logo, entende-se que “todos precisam de referências para serem assertivos”, destaca Rodacoski.
Então, até que ponto criar uma expectativa sobre algo ou alguém é bom para as relações sociais? O que sabemos até agora é que criar expectativa, positiva ou negativa, sobre algo é inevitável. É inato aos seres humanos. Por outro lado, saber as consequências que isso pode gerar em quem as ouve é essencial.
Segundo a professora, ao não acreditar em alguém, o investimento naquela pessoa tende a ser diminuído e perde-se a garantia das chamadas provisões ambientais, como estar junto, ajudar, elogiar, incentivar, entre outras.
Quando há esse abandono à própria sorte e a pessoa mesmo assim se mostra bem-sucedida, o que se costuma ouvir é ‘se superou’; ‘me surpreendeu’. Quando, na verdade, isso apenas “comunica que a pessoa estava sozinha e conseguiu o bom desempenho graças aos seus recursos internos (pessoais) e não por provisões ambientais do contexto”, explica Rodacoski.
Como o Efeito Pigmaleão é visto nas organizações?
Já que vivendo em sociedade as expectativas têm seus efeitos, dentro de uma organização não seria diferente. Afinal, não é à toa que as empresas também podem ser chamadas de microssociedades.
No âmbito empresarial, o professor da Uninter Julio Cezar Bernardelli revela que os administradores modernos reconhecem os estudos sobre o Efeito Pigmaleão. A Profecia Autorrealizável é muito bem-vista na área, porque ao acreditar nas pessoas você está fazendo com que elas deem o melhor de si. “E isso é importante”, destaca Bernardelli.
Então isso quer dizer que podemos criar um colaborador ou gestor bem-sucedido? Rodacoski garante que nenhuma pessoa é totalmente controlada a ponto de ser fabricada por outra. No entanto, podemos intencionalmente nos dedicar a prover os elementos que favorecem o desenvolvimento desse sucesso.
Para além disso, o professor acredita na essência da boa liderança e na autoconfiança. “Acreditar em si mesmo é saber que quando me pedirem alguma coisa, dentro da minha organização, e eu não puder fazer, o meu líder vai me dar oportunidades para que eu possa aprender”, exemplifica o docente sobre autoconfiança.
Como forma de ilustrar o poder da boa liderança, Bernardelli recorda uma pequena metáfora ocorrida com Mahatma Gandhi. Certo dia, uma mãe levou seu filho até Gandhi para pedir ao sábio que o menino não comesse mais açúcar. Ele, por sua vez, pediu que a família voltasse dali a duas semanas. Passado o período estipulado, a mãe retorna. Gandhi, então, olha firmemente nos olhos da criança e diz: “não coma mais açúcar”. A mãe agradece, mas fica confusa: “Por que você não falou isso há duas semanas?”. E ele responde: “Porque há duas semana eu também comia açúcar”.
Em resumo, para ser um bom líder e criar expectativas positivas em sua equipe, é preciso ser exemplo. “Não adianta falar para fazerem coisas que você não faz”, conclui Bernardelli.
Autor: Poliana Almeida – Estagiária de JornalismoEdição: Mauri Konig
Revisão Textual: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Reprodução