Redes sociais se consolidam como arena privilegiada de manifestação política

Autor: Sandy Lylia da Silva – Estagiária de Jornalismo

Pouca gente lembra do lançamento do Facebook. Em 2007, a rede social recebia suporte da língua portuguesa e chegava ao Brasil, três anos depois da sua criação nos Estados Unidos. No começo, a participação em redes sociais era vista como mais uma forma de entretenimento dentro do mundo digital. Não se fazia ideia do poder de influência que essa plataforma alcançaria, tornando-se capaz de interferir em eleições presidenciais ao redor do mundo.

Os smartphones vieram com a promessa de melhorar a comunicação e nos aproximar, modificando o formato das interações humanas. Graças a eles, passamos a estar conectados o tempo todo. Por si só, a tecnologia não tem nada de ruim, mas o seu uso de forma exagerada pode prejudicar as relações e até a visão de mundo.

Para analisar o panorama das redes sociais e suas nuances no cenário político, a professora da Escola Politécnica da Uninter Maria José Ferreira Strogenski mediou um debate com as professoras de Relações Internacionais e Ciência Política Natali Hoff e Karoline Roeder.

Intitulado “Política em tempos de redes sociais”, o evento foi transmitido pelo AVA Univirtus, no dia 19 de outubro. Cada vez mais, dentro do campo ciência política se estuda como as mídias sociais e a tecnologia estão transformando a dinâmica dos conflitos políticos, tema explorado pelas professoras.

O mundo moderno

Segundo a professora Natali, a globalização é um processo em que o mundo não está mais limitado a um continente, ou a um tipo de sociedade. “Esse mundo só é possível pois tivemos uma expansão capitalista, e junto com ela, todo um processo de construção de conexões e interdependência entre diferentes países, sociedades e indivíduos”, explica.

Contextualizando com uma perspectiva sociológica, Karoline aborda a globalização citando o sociólogo espanhol Manuel Castells, que em sua obra “A sociedade em rede”, primeiro volume da trilogia “A Era da Informação”, analisa as alterações profundas ocorridas na morfologia das sociedades a partir do advento da internet e do telefone móvel.

“A sociedade mudou sua configuração trocando as relações sociais físicas por híbridas, mudando também nossa percepção do tempo, afinal nos comunicamos a qualquer hora, assistimos o que queremos nos nossos horários de nossa preferência, o que não ocorria antes. As pessoas que não vivenciaram o mundo fora da era das redes sociais experienciam muita ansiedade por não compreenderem esta relação de limites entre tempo e espaço, e isso mudou de forma abrupta a estrutura social”, afirma Karoline.

Conforme explica Castells, na atualidade não são mais os Estados ou as corporações que são dominantes, mas sim as redes, dando um novo sentido ao conceito de capitalismo, transformando-o em “capitalismo informacional”. Quem controla a informação detém o poder – isto fica claro quando analisamos o monopólio empresarial do WhatsApp, Facebook e Instagram.

“Seria como se as instituições tradicionais tivessem perdido a relevância por essa modernidade líquida, pois a cada nova transformação tecnológica muda-se a forma de interação social. Quando se entende território como uma nação, a partir do século 20, com o desenvolvimento de estradas e rodovias ligando as pessoas, instituiu-se um sentimento de pertencimento, e com a internet surge uma dimensão nunca experimentada antes, o imediatismo, com transformação nas dinâmicas de interação social, ainda impactadas por motivações políticas e econômicas”, diz Natali.

A professora ressalta também que o monopólio ideológico de muitos meios de comunicação vem sendo diluído no ambiente das redes sociais. A opinião pública ganha mais instantaneidade, fazendo os meios tradicionais de comunicação perderem o controle das narrativas, fazendo com que surjam movimentos mais orgânicos e espontâneos, a exemplo do Black Lives Matter.

Contudo, ao mesmo tempo em que vivenciamos toda essa liberdade cibernética, temos em contrapartida a desregulamentação das redes sociais. Um ambiente de difícil controle das informações e ainda com baixo custo de veiculação.

Como as redes não se submetem ao crivo da ética e das técnicas jornalísticas para a divulgação de conteúdo, tornam-se espaço de distribuição de informações falsas, com interesses políticos não identificáveis, além de questões como as dos algoritmos, que levam à criação de bolhas, restringindo a dinâmica de interação a moldes personalizados de interesse.

“É uma faca de dois gumes”, explica Karoline. A informação atualmente corre de forma muito rápida, tanto com gente bem-intencionada que produz conteúdo de qualidade, quanto com pessoas se especializando na criação das fake news.

Natali levanta a questão do anonimato, da fluidez e do escasso controle dos fluxos de mensagens nas redes sociais, que são utilizadas para manipulação política, como aconteceu na votação do Brexit, em 2016, na Inglaterra. A campanha vencedora, “Vote Leave”, se notabilizou pela divulgação de informações falsas.

Para Karoline, a expectativa de que as redes sociais ampliassem o campo de debates, reforçando a democracia, foi frustrada. “Não aconteceu, e está longe de acontecer, falamos com quem concorda com a gente, criando bolhas de segregação firmadas pelos algoritmos”, pontua.

“Quando ocorre um posicionamento dando uma curtida em algum conteúdo político, isso gera um filtro que vai ressoar com esta preferência política, restringindo outros diálogos e personalizando as narrativas. As pessoas não dialogam mais, só existe a disseminação de ódio entre as partes, em que a intolerância predomina. Isto é muito prejudicial para a democracia”, completa Karoline.

A professora Maria José reforça que a falta de regulamentação faz com que as redes sociais se tornem nocivas. “O direcionamento para grupos ou assuntos afins, apagando as discrepâncias e anulando a perspectiva de discussão sadia entre os usuários, remete a uma impressão ilusória de que muitos pensam da mesma forma, não refletindo a realidade”, afirma.

Karoline aponta que, no que diz respeito à política, deveríamos seguir também personalidades com quem não concordamos para assim criar a possibilidade de “furar as bolhas”, ampliando o espectro ideológico que nos influencia, além de expressar real disponibilidade para o diálogo.

A vida longe das tecnologias é hoje impensável. Mesmo assim, é importante não se deixar dominar por aplicativos ou comunidades virtuais que nos instigam à polarização. Precisamos aprender a usar o mundo virtual de forma sadia, eis o desafio que se coloca no horizonte da democracia.

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Autor: Sandy Lylia da Silva – Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Pinterest


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