Diante da dor dos outros
Autor: Sandra Morais Ribeiro dos Santos*Nos últimos meses temos nos deparado com dores e sofrimentos com tal frequência que jamais vimos em nossa geração. O confronto com a morte, inevitável, nos leva a pensar sobre a insuficiência e as limitações de nosso próprio ser e viver nesta terra.
Não que o sofrimento ou a dor não existissem anteriormente, mas quando sentimos a dureza da morte às portas, tocando aqueles que amamos, as cores da vida mudam e tudo a nossa volta adquire outra dimensão. A insensibilidade e a indiferença dão lugar a lágrimas, a profunda tristeza e ao desespero em muitos casos. Afinal, vivenciar o luto é muito diferente do que teorizá-lo através de fatos e números.
O que falar ante a dor do outro? A solidariedade vem através de poucas palavras ou gestos de apoio, limitados no presente pelo distanciamento social. É um sofrimento que nos toca, nos cala, nos fala, mas que também nos ensina. Como cita o autor de Eclesiastes: “Há mais ensinamento na casa do luto do que na casa onde há festa, pois, a morte é o destino de todos” (Ecl 7,2).
Na experiência da morte somos confrontados com nossa própria humanidade naqueles que ficam enlutados e espelhada naquele que se foi. Será que realmente viveu? Conquistou seus sonhos e cumpriu seus propósitos? Amou apaixonadamente alguém? Será que se permitiu ser feliz e fazer outros felizes? Se foi um marido ou esposa, um avô, uma avó, um pai, uma mãe, um filho ou filha, um irmão, um amigo querido. Já não há lugar na terra dos viventes para este que até pouco tempo sorria conosco. E o que dizer? Ficamos calados, estagnados. Insuficientes e desnecessárias, as palavras ficam engasgadas na garganta e no pensamento.
Neste ponto vemos quão egoístas somos ao não ver realmente o outro, seja lá quem for. Olhamos, mas não enxergamos realmente através de nossa cosmovisão distorcida pelo eu. Presos em nosso próprio mundo interior, preocupados conosco mesmos, nossas coisas e prioridades, nossas vidas mesquinhas.
Assim deixamos por vezes de praticar o maior mandamento que é amar o próximo. Amar não consiste simplesmente em um mero sentimento como muitos imaginam. Amar é uma decisão. Envolve atitudes proativas em direção ao outro, seja ele quem for e mesmo que esta pessoa por vezes não mereça. Consiste em realizar o melhor que se pode naquele momento em prol daqueles com quem compartilhamos nossa caminhada diária. Ser o melhor pai ou mãe que alguém possa ter, o melhor chefe, o amigo mais querido. Enquanto há tempo, enquanto há vida.
Mesmo não querendo sentir a dor da separação causada pela morte ela irá chegar para todos um dia. Para alguns mais cedo. Para outros, pela sua resistência ou graça divina, bem mais tarde. Para quem vai, para trás ficam as fotos e as lembranças. Com o tempo a dor ameniza, as fotos envelhecem. Permanecem a saudade e o calor de bons momentos. Sim, estes são eternos em nós mesmos e são eles que confortam, nos ensinam a dar valor ao que realmente é precioso e a sermos gratos por cada dia vivido debaixo do sol. Como nos mostra o primeiro verso do Salmo 90: “Ensina-nos a contar nossos dias, para que alcancemos um coração sábio!”
* Sandra Morais Ribeiro dos Santos (foto) é teóloga e pedagoga, doutoranda e mestre em Teologia, e professora de Teologia da Uninter.
Autor: Sandra Morais Ribeiro dos Santos*Créditos do Fotógrafo: Gerd Altmann/Pixabay