Pandemia agrava situações de risco de profissionais de saúde; maioria são mulheres

Autor: Arthur Salles - Estagiário de Jornalismo

A pandemia de Covid-19 tem feito o mundo refletir sobre diferentes práticas econômicas e sociais, mas parte das desigualdades sócio históricas foi agravada pela doença. A vulnerabilidade dos profissionais de saúde, na linha de frente no combate do vírus, é uma delas. No Brasil, a área é composta em sua maioria por mulheres, aspecto que torna a atenção acerca desses profissionais ainda mais relevante.

O curso de Ciência Política da Uninter recebeu a pesquisadora Michelle Fernandez para explicar como as políticas públicas de saúde no Brasil têm colocado os servidores de saúde em situações de risco. A conversa foi mediada pelo professor Luiz Domingos Costa, com transmissão pela página do Facebook, em 3.set.20.

Michelle conduziu um estudo com outros cinco pesquisadores, realizado pela FGV (Fundação Getúlio Vargas). Publicada em agosto, a mais recente fase contou com a participação de 2.138 profissionais de saúde a fim de compreender o impacto da Covid-19 pela percepção de médicos, enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS).

O histórico social do papel da mulher como protetora é visto na representatividade dessas profissões. As mulheres correspondem a 77% do total de entrevistados no levantamento. O protagonismo, mais uma vez, é acompanhado de insegurança.

O estudo destaca a intensificação da desigualdade de gênero durante a pandemia. O aumento da demanda profissional é somado à sobrecarga de tarefas nos cuidados de casa e com a família.

“Neste sentido, muitas delas relatam, por exemplo, ausência prolongada de casa, dificuldades sobre com quem deixar os(as) filhos(as) para trabalhar ou medo de contaminar suas próprias famílias com a doença”, analisa o levantamento.

A ONU (Organização das Nações Unidas) chegou a contabilizar mundialmente essas tendências. Nas áreas de saúde e assistência social, as mulheres representam sete a cada dez dos profissionais. Quanto aos trabalhos domésticos, a estimativa do relatório é de que as mulheres acumularam três vezes mais das funções em comparação aos homens.

O estudo da FGV ainda aponta que a maior parcela dos profissionais relata ter medo do vírus, contabilizando 85% das respostas.  A insuficiência da resposta dos governos à crise é notada na insegurança dos participantes (30% se dizem não preparados para lidar com a crise e 68% não foram treinados contra a doença).

Em números absolutos, o Brasil é o país que mais registrou mortes de profissionais de enfermagem em decorrência da Covid-19. Segundo dados do Cofen (Conselho Federal de Enfermagem), 454 servidores tiveram a morte confirmada ou com suspeita pelo coronavírus. O total de casos reportados é de 41.926 até o momento.

“Isso mostra que, efetivamente, a gente vive uma situação de vulnerabilidade dos profissionais de saúde de uma forma geral, porque se acontece com os profissionais de enfermagem, muito provavelmente esses dados são igualmente alarmantes entre ACS e médicos”, comenta Michelle.

A principal crítica da doutora em Ciência Política recai na falta de coordenação do Ministério da Saúde e do governo federal. Os estados e municípios, que têm capacidades notadamente distintas, dependem da organização e operação do ministério em equalizar ao máximo a resposta sanitária.

“Nesse sentido, estados e municípios foram empurrados ao protagonismo para atuarem frente à pandemia. Isso gerou duas coisas que são muito importantes de se pensar. Por um lado, respostas completamente descoordenadas para a pandemia, vinculadas à capacidade desses estados e municípios. Por outro lado, respostas muitas vezes insuficientes, também por essa baixa capacidade”, explica a politóloga.

A desarticulação federal com os demais entes também é alvo de críticas na ausência de equipamentos de proteção individual. Dos entrevistados na pesquisa, 44% dizem não ter recebido insumos necessários, enquanto apenas 35% afirmam ter sido testados para Covid-19.

Para Michelle, esses equipamentos são fundamentais em qualquer contexto, especialmente durante a pandemia, em que esses profissionais são vetores da doença no contato com diferentes pessoas diariamente. Já os testes representam a melhor forma de rastrear os casos e efetivar medidas de controle da doença.

“Se a gente tivesse uma ação coordenada do governo federal, sob a batuta do Ministério da Saúde, a compra seria mais simplificada quando é um ente que tem mais capacidade. Ele também tem uma capacidade de coordenar a distribuição de uma forma mais inteligente entre os municípios e os estados”, conclui a especialista.

Você pode conferir a íntegra do bate-papo clicando aqui.

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Autor: Arthur Salles - Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: DFAT photo library/Creative Commons


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