O que você precisa saber sobre vacinas

Autor: Arthur Salles - Estagiário de Jornalismo

Diversas dúvidas permeiam a discussão sobre a vacinação. No final do século 18, o médico britânico Edward Jenner criou o primeiro composto ao imunizar uma criança contra a varíola. Embora o caso tenha sido um sucesso, pessoas passaram a desconfiar da eficiência desse meio de imunização. O movimento antivacina ganhou força a partir de 1998, quando o também britânico Andrew Wakefield publicou um estudo que atribuía o surgimento do autismo à vacina tríplice viral.

Veiculada na prestigiada revista de medicina The Lancet, a pesquisa foi alvo de contestações da comunidade científica. De dados manipulados por Wakefield ao registro da patente de uma vacina criada pelo próprio médico, as informações foram refutadas ao longo dos anos. A revista se retratou em público e Wakefield teve sua licença médica cassada em 2010.

O estrago, no entanto, já estava feito: em 2003, o Reino Unido registrou apenas 79% de sua população imunizada pela tríplice viral. Foi a menor taxa desde 1968, quando o programa de vacinação foi instituído na região. As distorções feitas na publicação são consideradas o estopim dos movimentos antivacinas que hoje percorrem o mundo e geram ainda mais insegurança em meio à pandemia de Covid-19.

Com o objetivo de desmitificar boa parte desses boatos anticientíficos, a 1ª Maratona de Saúde da Uninter recebeu o farmacêutico Daniel de Christo. O professor e coordenador dos cursos de pós-graduação em Saúde da instituição esclareceu dez pontos em relação aos métodos e resultados das vacinas.

O primeiro apontamento da apresentação tratou de diferenciar vacinação e imunização. A primeira é o ato de induzir um agente imunológico no organismo. Tendo sucesso, o resultado irá imunizar o paciente, criando células de defesa para combater a doença. Embora não haja total garantia da produção de anticorpos, o farmacêutico ressalta que são poucos os casos em que a imunização não acontece, da mesma forma como com qualquer medicamento.

Christo ainda destacou que a eficácia das vacinas é variada. Ao representar a situação com casos de vacinação contra a hepatite B, o professor explicou que a imunização deve ser medida pela produção de anticorpos no organismo da pessoa. “Se a pessoa não produziu os anticorpos, a gente repete o esquema vacinal e faz a titulação de novo”, informa.

Várias doenças foram erradicadas do planeta com o uso eficaz de vacinas. Dado como exemplo pelo apresentador, a varíola teve seu último caso registrado em 1977, na Somália. Para que esse controle aconteça, os países devem manter altas taxas de vacinação em seus territórios, com uma cobertura vacinal média de 95%.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que as vacinas evitam de 2 a 3 milhões de mortes por ano. Segundo a entidade, cerca de 1,5 milhão de óbitos podem ser prevenidos no período, caso a taxa de vacinação seja melhorada mundialmente.

Fases para aprovação

Toda vacina deve passar por rigorosos testes como forma de atestar sua segurança e eficácia. A fase pré-clínica concentra os estudos em animais e células. Em seguida, começam os testes em humanos.

No início, poucas pessoas participam do experimento. A fase seguinte analisa a capacidade de imunização da vacina em um grupo maior de pessoas. No último e mais crucial ciclo, milhares de pessoas são testadas ao redor do mundo para se comprovar a eficácia do imunógeno em diferentes populações.

O apresentador exemplificou a situação ao criticar a primeira vacina aprovada contra a Covid-19. Produzido pela Rússia, o composto é visto com desconfiança por grupos científicos, uma vez que seu anúncio foi feito antes da última fase de testes. O país também não divulgou os dados clínicos completos das primeiras etapas.

Ainda na corrida pela fabricação de um imunizante contra o vírus, Daniel de Christo citou outras iniciativas. Das seis que hoje estão na fase final de estudos, o Brasil já confirmou o teste de três delas por meio da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A principal é a desenvolvida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, em parceria com a companhia anglo-sueca AstraZeneca. Os testes serão conduzidos em 5 mil brasileiros, entre 18 e 69 anos de idade.

Além dessa, duas vacinas chinesas serão testadas no país. O palestrante aproveitou o momento para desmentir outra hipótese anticientífica. Boatos sugerem que a China teria criado o coronavírus como forma de lucrar a partir da venda de medicamentos e vacinas. “Nossas análises claramente mostraram que o Sars-Cov-2 não é uma construção de laboratório e não foi propositalmente manipulado”, diz Christo ao citar um artigo da revista científica Nature sobre o caso, publicado em março deste ano.

Apesar das desconfianças que cercam o debate sobre as vacinas, os brasileiros estão dispostos à imunização contra a doença. Uma pesquisa do Datafolha, realizada entre 11 e 12 de agosto com 2.065 participantes adultos, indica que 89% dos entrevistados querem se vacinar assim que houver a possibilidade. Outros 9% dizem ser contrários à ideia, enquanto 3% não souberam responder.

Em comparação, os Estados Unidos apresentam números mais resistentes à vacinação contra a Covid-19. A pesquisa mais recente aponta que 35%, mais de um terço, dos 1.261 estadunidenses entrevistados rejeitam a imunização contra a doença. Os que são favoráveis representam 60% dos participantes da pesquisa feita pelo consórcio entre NPR, PBS News Hour e Marist Poll. Os 5% restantes não têm certeza.

O país norte-americano passou de 180 mil mortes pelo coronavírus. O número de casos é de 5,8 milhões. São as estatísticas mais graves mundo afora.

Imunidade de rebanho

Christo enfatizou a necessidade da vacinação em larga escala. Segundo ele, o processo assegura a “imunidade de rebanho”. A expressão diz respeito ao impedimento da transmissão de determinada doença quando a maioria de sua população está imunizada, por meio da vacinação ou da proliferação do vírus.

Durante a pandemia do coronavírus, o método foi defendido por detratores do isolamento social. A Suécia, por exemplo, apostou na estratégia de disseminação controlada, mas teve que recuar e implantar medidas de confinamento.

O governo sueco admitiu que deveria ter tomado medidas mais rígidas desde o início da contaminação no país. Esperava-se que, até maio, 40% da população da capital Estocolmo estivesse imune ao vírus. No entanto, um estudo publicado em 11.08.2020, no periódico médico Journal of the Royal Society of Medicine, analisa que a taxa de imunização chegou a somente 15%. As informações foram publicadas pela Agência Lupa.

O país escandinavo tem a maior taxa de mortalidade da região, com 575 mortes por milhão de habitantes. Dinamarca e Noruega têm taxas de 107 e 49, respectivamente.

A OMS descarta a imunidade de rebanho como forma de combate à Covid-19. A organização declarou que estudos em mais de 50 países indicam que menos de 10% da população apresenta anticorpos. Pesquisas demonstram que o percentual necessário para a imunização coletiva seria entre 40% e 70%.

A doença já soma mais de 803 mil mortes ao redor do mundo. Ao todo, 23,3 milhões de casos foram notificados oficialmente. No Brasil, o coronavírus já fez mais de 114 mil vítimas do total de 3,5 milhões de casos contabilizados. O país é o segundo com o maior número de mortes e casos no mundo todo.

A palestra fez parte da programação da 1ª Maratona de Saúde da Uninter, organizada pela Escola de Saúde, Meio Ambiente, Biociência e Humanidades. Transmitida ao pelo Facebook, a maratona teve como foco a saúde global e o mundo pós-pandemia. O evento contou com 14 apresentações, das 9h às 22h. Todas elas podem ser conferidas na página Maratonas Para Desenvolvimento Sustentável Uninter.

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Autor: Arthur Salles - Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro


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