É possível ser justo, ético e feliz ao mesmo tempo?

Autor: Luís Fernando Lopes*

Se a justiça desaparece é coisa sem valor o fato de os homens viverem na Terra (Immanuel Kant).

André Comte-Sponville (foto), no Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, ao tratar da virtude cardeal da justiça cita Alain, que afirmava: “a justiça existirá se a fizermos. Eis o problema humano”. E a essa citação Comte-Sponville acrescenta alguns questionamentos: mas que justiça? Como fazê-la, sem saber o que ela é ou o que deve ser?

Das virtudes cardeais, a justiça é aquela que Aristóteles considera a virtude completa que nenhum tipo de felicidade dispensa. Ou seja, todo o valor a supõe e toda humanidade a requer. Mas por que no dia a dia parece imperar a lógica da conveniência, do jeitinho?

Mas se a justiça como nos ensinam os clássicos é agir respeitando a legalidade na cidade e a igualdade, como manter a igualdade entre seres humanos desiguais? E Commte-Sponville nos ajuda com a resposta, lembrando que lei é lei, seja justa ou não, mas ela não é a justiça. Assim, não se fala apenas da justiça como fato, ou seja, a legalidade, mas da justiça como valor e como virtude, ou seja, igualdade, equidade).

Essas considerações nos ajudam a refletir sobre a trajetória histórica da humanidade, assim como sobre os desafios do nosso tempo. Estar ciente de que se agiu em conformidade com a justiça nos traz alegria e satisfação. Por outro lado, presenciar situações injustas, ainda que não sejam diretamente ligadas a nós, causam indignação e mesmo sensação de impotência, quando se manifestar ou agir pode trazer consequências ainda mais desastrosas.

Há que se pensar também na ética da conveniência. Como é possível alegrar-se ou fingir estar alegre e satisfeito com algo conquistado injustamente? Por uma vitória conquistada com trapaça? Pelo enriquecimento conquistado ilicitamente provocando dor e sofrimento de quem foi lesado? E ainda é preciso juntar a isso os discursos elaborados para justificar as malandragens, jeitinhos, falcatruas como se fossem naturais e necessárias, afinal o mundo é dos espertos e todo mundo faz, se diz no senso comum.

Nesse mar de contradições falta paz, porque a paz verdadeira é fruto da justiça. Se não há verdadeira justiça não haverá verdadeira paz.

Como salienta André Comte-Sponville, a justiça não tem um dono, um partido uma instituição e todos estão moralmente obrigados a observá-la. Só há justiça se há justos para defendê-la. É preciso respeitar as leis, cumprir deveres, garantir direitos, mas nunca sacrificando a justiça. A máxima aristotélica pode certamente nos ajudar na compreensão e no agir: “não é justiça que faz os justos, são os justos que fazem a justiça”.

* Luís Fernando Lopes é professor da área de Humanidades da Escola Superior de Educação da Uninter.

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Autor: Luís Fernando Lopes*
Créditos do Fotógrafo: Yves Faure/Wikimedia Commons


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