De onde vêm e para onde vão os nossos tantos partidos políticos?
Autor: Luiz Domingos Costa*
O Brasil possui atualmente 33 partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, dos quais 25 contam com ao menos um representante na Câmara dos Deputados. Baseando-se no Número Efetivo de Partidos (NEP), um cálculo que leva em conta o tamanho das bancadas partidárias em relação ao total de parlamentares e às bancadas dos demais partidos da Câmara, o Brasil apresenta hoje 16 partidos políticos efetivos. Trata-se de um número bem acima dos valores vistos ao redor do mundo, que em geral variam entre dois (Estados Unidos, por exemplo) e cinco (Alemanha, por exemplo).
A história partidária brasileira, desde a criação de partidos nacionais e da massificação do voto em 1946, experimentou uma enorme variação desses valores. Nos anos 1950 oscilou de três para cinco, tendência interrompida pelo bipartidarismo e pelas restrições impostas pelo Regime Militar, entre os anos 1960 e 1970, ficando abaixo do valor de dois partidos efetivos. A partir da redemocratização, entre as décadas de 1980 e 2000, os valores cresceram entre três e nove, mas jamais ultrapassaram um dígito.
A partir dos anos 2010, os valores assumiram dois dígitos, subindo sistematicamente até atingir, nas eleições de 2018, o recorde atual de 16 partidos efetivos. Impressiona, ainda, a existência de 77 pedidos de autorização de novos partidos, conforme o site do Tribunal Superior Eleitoral. Quais as causas dessa multiplicação de partidos dos últimos anos?
Em primeiro lugar, é preciso diferenciar os partidos autorizados pela justiça daqueles partidos que efetivamente alcançam cadeiras nas casas legislativas. A maioria das democracias avançadas conta com dezenas e, em alguns casos, centenas de partidos autorizados a atuarem em diversas atividades políticas ou sociais.
Entretanto, raramente os parlamentos nacionais abrigam mais do que algumas poucas organizações. O que diferencia o Brasil, portanto, não é a expansão no pedido de registro de partidos (algo que já experimentamos nos anos 1980) mas sim o crescimento de siglas com assentos na Câmara dos Deputados.
Essa explosão tem algumas causas. Em primeiro lugar, a existência de um sistema eleitoral de lista aberta (que o voto se dá nos candidatos, preferencialmente) em distritos eleitorais com muitas cadeiras legislativas (entre oito no Acre e 70 em São Paulo). Essa combinação faz com que alguns candidatos muito populares possam se eleger com os seus votos individuais ou ainda, o que é pior, eleger outros candidatos com votação muito aquém da média dos eleitos.
Além disso, o Supremo Tribunal Federal autorizou que um deputado possa migrar para um partido recém-criado, impedindo a migração para partidos previamente existentes. Com isso, criou um incentivo para que os parlamentares descontentes em suas organizações criem um partido para chamar de seu. Finalmente, a criação do Fundo Eleitoral e o aumento do Fundo Partidário também incentivam a criação de novos partidos por políticos interessados em comandar vultuosos recursos para suas campanhas.
Algumas iniciativas contrárias, isto é, que visam diminuir o número de partidos representados nas casas legislativas, foram aprovadas pela reforma eleitoral de 2017. A primeira é a reintrodução da cláusula de desempenho de 1,5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 1% dos válidos em cada um.
Os partidos que não atingirem esse patamar ficarão excluídos da divisão do fundo partidário e da propaganda eleitoral no rádio e na televisão, mas ainda terão acesso ao fundo eleitoral a cada dois anos. A segunda é a proibição das coligações nas eleições proporcionais. Por essa nova regra, as pequenas siglas ficam sem poder se coligar com as grandes e contornar a necessidade de alcançar o quociente eleitoral.
Essa medida valerá para as eleições de 2020 em diante. As duas alterações aumentarão a exigência para utilizar os recursos públicos financeiros e o acesso à propaganda eleitoral e tenderão a causar fusões entre pequenas siglas. Por outro lado, a reforma de 2017 estabeleceu que a distribuição das sobras também abarcará as siglas que não alcançaram o quociente eleitoral, o que é um fator que tende a dar sobrevida para muitas agremiações pequenas.
No conjunto, as medidas recentes operam em direções contraditórias e, embora seja esperada uma redução no número de partidos efetivos em médio prazo, essa redução não será suficiente para colocar o Brasil próximo aos países com multipartidarismo moderado. Nesse sentido, a experiência dos anos 2010 tenderá a se repetir por um bom tempo e o eleitorado terá que aprender a conviver com um ambiente ocupado por mais de uma dezena de partidos políticos relevantes.
* Luiz Domingos Costa é membro do Observatório de Conjuntura e professor de Ciência Política da Uninter.
Créditos do Fotógrafo: Beto Barata/Agência Senado