As provas e as provações de Victor
Letícia Costa – Estagiária de Jornalismo
Victor passou a infância entre o hospital e a escola. No hospital, encarava oito cirurgias na cabeça; na escola, enfrentava o bullying devido às múltiplas deficiências físicas. Aos 17 anos, a malformação avançou até a medula óssea. Passou por duas embolizações no cérebro e colocou dreno na espinha para conter o líquido. Hoje, aos 24, anda com ajuda de muletas, é cego do olho esquerdo e tem só 20% da visão direita. Que futuro pode ter alguém nessas condições?
Um futuro promissor, atesta Victor Alves Homem. Aos 24 anos, está no segundo período do curso de Direito da Uninter, depois de concluir Ciência Política aos 21. Fora isso, a rotina ainda inclui academia, fisioterapia, reeducação visual, natação, tratamento psicológico, terapia musical e trabalho voluntário na igreja. “Minha mãe às vezes briga comigo. Preciso administrar bem o meu tempo, quero abraçar o mundo”, diz.
“Abraçar o mundo” soa extraordinário vindo de quem passou num hospital a fase da vida em que a maioria das crianças estava brincando. Uma malformação da artéria vascular neurocerebelar resultou num emaranhado de veias e a obstrução da passagem de sangue. Após uma das cirurgias – todas realizadas no Hospital das Nações, em Curitiba –, Victor chegou a ficar um mês na UTI respirando com ajuda de aparelhos. A vida parecia improvável, mas ele superou mais essa.
Por inusitado que pareça, na escola sofria bullying e preconceito. Suas deficiências fizeram com que passasse por várias fases de adaptação. “Nasci canhoto, depois virei destro, recentemente voltei a ser canhoto”. Mas o apoio que recebeu o ajudou a tolerar os colegas e a driblar a deficiência para estudar. “Não sofria só com colegas, sofria para estudar também. Sofria com a parte de zoação, mas por outro lado tinha a ajuda da minha mãe. Graças a Deus tenho uma família boa”, diz.
Apesar do apoio, as provações pareciam não ter fim. Aos 17, quando imaginava que as idas ao hospital haviam terminado, descobriu que a malformação tinha se dividido em várias partes e atingido a medula óssea. Foi então que, em 2009 e 2010, teve de realizar duas embolizações no cérebro e instalar um dreno na espinha para conter o líquido. Hoje, além dos problemas de visão, ele tem dificuldades de locomoção e equilíbrio, caminha com auxílio de outra pessoa e uma muleta.
Mas as deficiências causadas pela obstrução da passagem de sangue de artérias do cérebro não afetaram seu processo de aprendizagem. A primeira consequência da compressão dos nervos óticos foram dupla visão e visão estrábica, que depois evoluiu para cegueira total do olho esquerdo e perda de 80% da visão do direito. “Graças a Deus, meu processo cognitivo é 100% saudável. Sou apaixonado pelo conhecimento”, diz.
Victor faz parte de uma estatística que, embora pequena, enche o Brasil de orgulho. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 45,6 milhões de brasileiros afirmam ter algum tipo de deficiência, o que representa 23,9% da população. Pelos dados de 2010, apenas 6,66% deles chegam ao ensino superior. Por integrar a primeira estatística, parecia improvável que Victor pertencesse à segunda. Ele provou duas vezes que é possível.
O sonho de trabalhar com política foi a principal motivação de Victor para fazer primeiro Ciência Política e agora Direito. Durante toda a primeira graduação ele teve apenas cinco faltas. “Quero ser candidato futuramente. Preciso entrar em um partido e ser bem aceito. Já tenho plataforma política e planejamento eleitoral. Tenho vários colegas que mexem com isso. Escolhi estudar na Uninter porque sou bem recepcionado e aceito. Por ter o SIANEE e por gostar da área jurídica”.
Criado em 2006 pela professora Leomar Marchesini, o Serviço de Inclusão e Atendimento aos Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (SIANEE) é responsável pelos cuidados aos estudantes com deficiência. Desde sua fundação, o serviço já ajudou na formação de mais de 500 alunos de cursos presenciais e a distância da Uninter.
Edição: Mauri König