Reforma da Previdência pune uma segunda vez a mulher, já em desigualdade no trabalho
Hoje não há idade mínima para a aposentadoria por tempo de contribuição. A exceção é a aposentadoria por idade: 65 anos para os homens, 60 para as mulheres. No caso de se aposentar por contribuição, são 35 anos para os homens e 30 para as mulheres. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016 enviada pelo governo ao Congresso Nacional muda todas essas regras.
Se aprovada a PEC, quem quiser se aposentar precisará atingir uma idade mínima de 65 anos, tanto para homens quanto para mulheres. No caso de aposentadoria por tempo de contribuição, terá de ser no mínimo 25 anos para todos (o valor é proporcional e para receber 100% os contribuintes, tanto homens quanto mulheres, terão de pagar ao INSS durante 49 anos).
Em suma, a reforma da Previdência iguala homens e mulheres na aquisição do direito à aposentadoria. “Isso significa alterar regras que são válidas desde 1988 e estabelecem desde então uma redução de cinco anos no tempo de contribuição e na idade para as mulheres se aposentarem. Mas será que a proposta da PEC atende à igualdade estabelecida na Constituição?”, questiona Estefânia Barboza, professora do Mestrado Acadêmico em Direito do Centro Universitário Internacional Uninter.
Estefânia lembra que no artigo 5.º, por exemplo, a Constituição estabelece os mesmos direitos entre os homens e as mulheres. “Mas, na Previdência Social, os atuais artigos garantem redução de cinco anos no tempo de contribuição e de idade para a obtenção da aposentadoria pelas trabalhadoras rurais, servidoras públicas, professoras ou celetistas”, pondera.
Para Estefânia, essa distinção não se dá pela dupla jornada de trabalho, pois, apesar de existir, ela não impacta na expectativa de sobrevida das mulheres. “Talvez por isso o atual governo tenha pensado na possibilidade de equiparar homens e mulheres na nova regra de aposentadoria – que será adquirida aos 65 anos de idade, com pelo menos 25 anos de contribuição e cujo valor será de 51% da média dos salários de contribuição, acrescidos de um ponto porcentual para cada ano de contribuição considerado na concessão da aposentadoria”, explica a professora.
Embora vários países europeus já tenham estabelecido idade igual para homens e mulheres, Estefânia acredita que no Brasil a mudança ampliará ainda mais a desigualdade existente. “As relações de trabalho ainda mantêm as mulheres em condições de desigualdade. Isso acontece porque existem mais mulheres do que homens na economia informal, pois essa é uma forma de conciliar o trabalho e os afazeres familiares. Nesses períodos, a mulher normalmente fica sem contribuir com a Previdência”, esclarece.
A professora lembra que, além disso, muitas não têm trabalho remunerado durante grande parte de sua vida em função das responsabilidades familiares e da maternidade. “Por essa razão, elas não conseguem adquirir aposentadorias iguais às dos homens”, diz. Segundo ela, dados do Ministério da Previdência mostram que, no Regime Geral da Previdência Social, poucas mulheres se aposentam por tempo de contribuição, além de receberem benefícios 30% menores que os homens.
“Igualar homens e mulheres na Previdência deveria vir depois de alcançada igualdade real nas responsabilidades domésticas e também no mercado de trabalho, já que os salários recebidos em atividade refletirão diretamente no benefício a ser adquirido. Pensar diferente é punir mais uma vez as mulheres e ampliar a desigualdade de gênero existente no Brasil, como na atual Proposta de Emenda à Constituição”, conclui Estefânia.
Edição: Mauri König